9 semanas de ficção

                      Do livro “9 semanas de ficção”.

                                       Volume 1               

                                       PARTE IV                                       

 

                                         A dama

 

          Era uma vez uma senhora chamada Adélia, que trabalhava de manicure, casada com Bruno, um operário da construção civil.

          Adélia, uma linda mulher de rosto e de tudo, que não se cuidava, não ia a salão de beleza, dispensava maquiagem, não fazia as unhas, não tinha vaidade. Era uma mulher simples que adorava uma mini blusa e um short curto colado ao corpo, traje suficiente para mostrar que tinha uma cintura fina, pele limpa, pernas grossas e curvas perfeitas de uma mulher bonita de corpo. Era com isso que Bruno não se conformava. Ele preferia que ela usasse roupas discretas para  não chamar muito a atenção, pois, mesmo usando trajes longos e folgados, não ia fazer muita diferença, pois  a beleza dela  dava  para  ser vista mesmo que tivesse o seu corpo todo coberto.

          Bruno frequentava a Boate Verônica todos os sábados. Quase não dançava, mas gostava de tomar uma gelada e de apreciar os casais dançarinos. Nunca levou a sua esposa porque morria de ciúmes. Acreditava que todos iam notar a beleza dela e os homens iam querer dançar com ela agarradinhos.

          Adélia acomodou-se com as atitudes ciumentas do esposo. Procurava sempre mudar de assunto quando ele começava a implicar com as roupas. O problema era quando ele cismava que tinha um homem olhando demasiadamente para ela.

          Até que um dia de domingo, à tarde, Bruno tomou “todas” e, no final do dia, começou a provocar Adélia, que ainda estava trabalhando, fazendo as unhas da última cliente do dia. Mesmo trabalhando em casa, Bruno queria que ela fizesse  uma  pausa  para  trocar  de roupas e depois continuar com o serviço. Ela recusou-se, alegando que não havia  necessidade, pois precisava ficar à vontade e não tinha ninguém estranho: as pessoas presentes eram ele, ela e a cliente antiga. Não adiantou, pois Bruno  estava  decidido  a obrigá-la a mudar de roupa.                         

          Adélia pediu licença à cliente e enfrentou o esposo, dizendo que não ia ceder. Ninguém ia obrigá-la a trocar de roupas. Bruno usou expressão de baixo calão e tentou agredi-la fisicamente. Só não a espancou porque a cliente  posicionou-se entre eles.

          Adélia desabafou dizendo, com as lágrimas no rosto:

          - Não vejo motivo para tanto ciúme. Trabalho em casa. Só tenho cliente do sexo feminino. Vivo eternamente em casa. Você vai ao baile todos os sábados, não me leva, chega bêbado e abusando. E, ao invés de descansar aos domingos, ainda vai “encher a cara” e vem dar uma de machão.   

          Bruno tentou nova agressão, e aí a cliente pediu licença e saiu com as unhas feitas pela metade.

          Neste momento, Adélia  aproveitou  para  completar   o desabafo:                                                                                        

          - Tu estás vendo a consequência? Mais uma cliente que foi embora por tua causa. Mais uma, das tantas, que não vai voltar porque tu vives perturbando.

          -  Sabes  o  que  vou  fazer?  Ficar  sozinha!  Pode   ir embora. A casa agora é só minha. A tua parte, os cinquenta por cento que te pertenciam, foi consumida pela bebida. Você bebeu sozinho. Tudo aqui me pertence. Pegue as tuas roupas, os vasilhames de cerveja que estão espalhados pelo quintal. Vai embora, agora, ou fique sem direito de tomar bebida alcoólica, pois, de agora em diante, quem vai mandar aqui sou eu. Fui clara?

          Bruno pegou uma mala, que era dela, colocou as suas roupas limpas e sujas, quebrou as garrafas vazias e saiu zangado batendo a porta. Adélia juntou os cacos, pôs no lixo, e passou a noite mais maravilhosa de sua vida, pois se sentiu aliviada e acreditou que ia reconquistar todas as clientes e, também, os homens que eram impedidos de frequentar a sua casa por causa do ciumento do seu ex-marido.                                                                                                                                                                                                                                        

          No dia seguinte, Bruno, arrependido, apareceu muito  cedo tentando abrir a porta com a sua chave, mas não conseguiu porque Adélia já tinha mandado trocar a fechadura. Ele bateu várias vezes, cansou de chamar Adélia, depois saiu desiludido. Ela ouviu tudo e ficou quieta para caracterizar que não estava em casa.

          Ao anoitecer, Bruno ligou para dizer que não ia mais incomodá-la. Disse todas as bobagens e desligou. Ela nada disse - só ouviu e agradeceu a Deus mais uma vez.  Naquele      mesmo dia, Adélia foi ao salão de beleza, produziu-se no capricho, depois foi a uma butique e comprou: um vestido longo vermelho, batom vermelho, creme para o corpo, perfume francês, colar, pulseira, brinco de argola e sandálias salto alto. Ela passou a semana toda se preparando física e psicologicamente para ir, pela primeira vez, ao baile na Boate Verônica, pois queria surpreender o seu ex-marido.

          No primeiro sábado após a separação, Adélia vestiu o longo vermelho, passou o batom cor de sangue, pôs o colar, a pulseira, um banho de perfume, calçou salto alto e foi ao baile. Logo que entrou, notou a presença de Bruno; fingiu que não viu, sentou-se à primeira mesa, longe dele e bem próximo  de  um  grande  espelho.  Bruno  chamou  o garçom, pediu mais uma cerveja e, quando foi servido, disse:

          - Olhe pelo espelho, disfarçando, e veja aquela dama de vermelho.

          - Sim! Estou vendo e, por sinal, é muito bonita.

          - Observe que quando ela se levanta, todos ficam animados.

          - Mas, é normal. Toda dama bonita, assim como ela, chama mesmo a atenção.

          - Ela  já  foi minha,  e  o  culpado,  da separação, fui eu.

          - Não acredito! – Duvidou o garçom.

          - Hoje, choro de ciúmes porque não pude me controlar.

          - E ela não para de dançar. Parece até que está sendo disputada.

          - Por favor, garçom, apague a luz, porque não quero que ela veja a minha tristeza.

          - Acredito que não adianta ficar se escondendo.  Se  elajá não mais te pertence, procure esquecê-la, pois vai ter que se acostumar a vê-la dançando nos braços de outro, e ainda tem que disfarçar o ciúme, porque ela tem todo o direito de escolher um novo pretendente para evitar viver novamente com o homem errado e ter que aturá-lo por muito tempo. Todos nós temos o direito de procurar o melhor, com amor, porque, sem ele, a vida não tem graça e a maioria tem que disfarçar, até encontrar o par perfeito para uma dança de satisfação, independente da letra da música Viver bem e ter a oportunidade de possuir o melhor é privilégio de poucos, porque a humanidade vive correndo atrás da matéria, enquanto    o   espírito   fica   desvalorizado   por   falta    de conscientização. E a vida a dois não depende só de amor, pois o desrespeito, a embriaguez e a incompreensão têm influência  na convivência, porque uma pessoa que anuncia que quer ficar bêbada para dormir e não ver outro homem abraçar a sua ex-mulher, é porque fez por merecer e jamais vai ter o perdão dela, e nunca mais vai ser digno de ter, ao seu lado, uma mulher qualquer, imagine uma dama, muito elegante, de vestido vermelho, toda produzida e tão cobiçada por muitos cidadãos...

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Roger Dageerre

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