Volume 1
FINAL
O poder da rádio
Era uma vez um paciente de nome Rosalino que recebeu a triste notícia que estava de alta. Triste porque ele já sabia que o sua doença era incurável e precisavam do seu leito para tentar salvar outras vidas. Em outras palavras, ele era um paciente terminal que foi convidado para morrer em casa. O fim de um homem que foi trabalhador honesto, respeitador, que ajudou a construir igrejas, fez muitas doações, praticou vários esportes, foi saudável até quando era moço e com orgulho conseguiu salvar quatro crianças que estavam se afogando. Tinha também defeito invisível, e o mais visível era amar demais. Um velho que estava deixando duas filhas e um neto. Uma de classe média e a outra rica por ter estudado muito e porque teve a sorte de se casar com um homem milionário. Era a Rosa e a Flor dos encantos do senhor Rosalino. Enquanto esteve internado, conseguiu falar com algumas pessoas, mas quando voltou para a casa de sua filha Rosa, simplesmente silenciou. Nada dizia e fingia que não ouvia. Sua filha procurava trata-lo da melhor maneira possível.
Quando saiu do hospital, ficou muito mais teimoso, pois se recusava até mesmo a falar. Naquele mesmo dia, da alta hospitalar, apareceu o seu neto João Pedro gritando que queria olhar o seu avô. Naquele momento, era hora da aula de espanhol, mas obrigou o motorista particular a desviar o caminho da escola para ele poder abraçar o seu querido velho. Desumano seria qualquer motorista que não obedecesse. Ao entrar, tomou a benção, e a sua tia Rosa explicou que o pai dela, avô do menino, não queria falar e nem ouvir. João Pedro mal acatou a informação e foi correndo ao quarto do seu querido avô. O motorista entrou logo atrás e pode olhar a satisfação do velho. O garoto chegou bem perto do ouvido do avô e perguntou:
- O que o vô quer? – Continuaram abraçados e o velho falou só para o neto ouvir. Depois o menino correu para acozinha onde estava a sua tia e disse: - Ele falou comigo. Ele quer um rádio...
– Não temos, mas ele pode ouvir pela TV.
– Ele quer ouvir com o rádio encostado ao ouvido. O meu pai disse que ele costumava ir ao estádio levando a bandeira do Vasco e um rádio de pilhas. Assistia ao jogo ouvindo a rádio...
– Não temos – disse a tia.
– Lá em casa tem um. - E pediu para o motorista se apressar.
– Você não pode perder a aula de espanhol – disse o chofer.
– Primeiro vamos buscar o rádio, depois vamos ao colégio. Ok?
– O empregado doméstico nada disse, mas obedeceu a ordem de um menino de apenas oito anos. Entrou em casa, pegou o rádio e pediu ao motorista para comprar seis pilhas da marca Panasonic. Eles foram ao supermercado mais próximo e o motorista comprou as pilhas e nem perguntou por que tinha que ser Panasonic. Naquela hora, com certeza, já tinha começado a aula de espanhol. Chegaram à casa da tia e o menino foi direto ao quarto do velho e perguntou:
- Qual a rádio?
O velho virou a cabeça para ficar de frente ao neto e disse: - frequência 100,9 MHz, prefixo ZYD825, rádio Jovem Pan, São Paulo.
O garoto, na presença do motorista, sintonizou direitinho e colocou o rádio na cabeceira da cama. O velho agradeceu com um sorriso e se arrastou na cama até ficar com o ouvido próximo do rádio. O menino jogou beijos ao avô e saiu apressado para assistir ao final da aula de espanhol.
No dia seguinte, o garoto saiu mais cedo, pois queria olhar o avô novamente antes da aula. A tia nem chegou a abençoá-lo, pois o menino foi correndo ao quarto do senhor Rosalino. Logo voltou com olhar de tristeza dizendo:
- Tia, o vô não está respondendo... O rádio está ligado, mas ele não me respondeu...
– Calma, ele passou a noite toda ouvindo a Jovem Pan. Deve estar com sono. Vá assistir a sua aula e depois volte para conversar com ele. Ok?
O menino saiu com cara de choro repetindo: “Ele não me respondeu... Não me respondeu... O meu vô não me respondeu”...
Roger Dageerre.
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