MANIAS DE CORAÇÃO I

 

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Meu coração, ao ver-te, descansa,

mas também se cansa ao ver-te demais.

Minha alma inteira, ao ver-te, se apluma,

mas cai como pluma ao ver-te demais.

 

Quando estou contigo, ao ouvir-te desperto,

ao sentir-te mais perto, já sonho demais

e meu peito inteiro se desbotoa,

e depois fica à toa, gemendo seus ais.

 

Ao ver-te na rua, não te sinto gente,

meu peito te sente uma coisa a mais:

um deus verdadeiro, que cura a tristeza,

que esparge beleza nos campos da paz.

 

Mas, meu coração, ao ver-te tão gente,

de novo se sente perdido de espanto.

Aceita choroso que és pó, que és terra

e de novo se encerra, chorando seu pranto.

 

Assim ele hiberna em fossa caído,

o corpo dormido só pensa em morrer.

Nada lhe importa, nem morte nem vida,

sua alma sofrida recusa o viver.

 

Porém, de repente, cansado, carente,

um grito estridente da boca lhe escapa;

e ele se empina, se empluma e se inflama,

e depois, como chama, da fossa se safa.

 

Passam uns dias, e ainda dorido,

porém, colorido, ao ver-te se solta.

De novo se enche, e de plumas se enfronha,

e todo sem-vergonha a querer-te ele volta.

 

Dado Carvalho

Sorocaba, 20 de julho de 1976

O Dadão tinha exatos 30 anos de idade.

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