No Colo do Sertão
Mestre Tinga das Gerais
Sô matuto
Sô catrumano
Imbigo interrado
Nesse abençuado chão
Tenho um orgúio profundo
Im sê oriundo desse rincão
Vivê esse isprendô
No colo do sertão.
Minha istóra vem de geração
Cumo aquele véio muin
Adonde passô as água e o vento
Tomém passô um pedaço de mim.
Meus bisavó na labuita
Terra servage e sagrada
E êz ali na luita
Vida de cão e regrada.
Arado e carro de boi
Distocá e aperperá o chão
A isperança tava im Deus
Essa num faia não.
Lidano cum o sole e a seca
Mais tomem cum a isperança
Os juêi im carne viva
Quem ispera sempre arcança.
E do céle broita a chuva
E os pingos bejano a terra
Meus zóio mira a distança
E vê o sorriso da serra.
Serra que me viu nascê
Cumo a semente de fêjão a broitá
Os corgo derrama na serra
Cachuêra a derramá.
Eu o mais véi dos oitio
Ovino aquela meludia
Da chuva dengosa correno
Batizano aquela magia.
Aquela Gamilêra
Da donde nóis brincava
Tá aqui isparramano sombra
Aqui nóis tamém dançava.
Os zóio de papai briava!
Ele oiava pás mão e dizia:
- Condo a gente faiz nossa parte
Deus devorve cum aligria!
Naquilo as lágrima discia
Mamãe com o telço na mão
E nóis na Ave Maria
Agardiceno cum imoção.
A criação filiz!
A pastage virdinha feitio um piriquito
As têta das vaca bunita
E o tôro pilão ruliço!
As panela no fugão
No calô da brasa do Tingui
Aquele chêro gostoso!
Do arroz com frango e piqui.
O forno de barro
Trazeno as gustuzura
Pão de quêjo, Broa e Bolo de Fubá
O café? Feitio cum rapadura!
A galinhada no terrêro
Siscano as paia de mio
E o galo cantado
Fazeno o disafio.
Disafiô a Saracura
Lá na curva do brejo
Aos zóio do João-de-barro
E do coleiro Bico Amarelo.
Óia! Aquilo era um cenáro divino!
A passarada agasaiada
Os zóios miúdo nos ninho
Era o silenço deálima lavada.
A pareia já na canga
E o carro na isperá
O mio era pu muin
A prudução era o fubá.
Hoje imociono im vê essa herança
Dêxada pelo meu veio pai
Aquele carro de boi surrado
Belço do prefume do orvai.
Ele pode contá
Pelo ranger no istradão
Infrentô sole e vento
Cum o risumo da prantação.
A portêra centenára
Puronde passô muitias vida
Aqui comemoremo a saga
Sabore de muitias lida.
Me alembro do istradão
Da donde via meu pai chegá
O Colosso vinha na frente
Pa mode avisá.
No colo do sertão
Passado e presente de mim
O paraíso na álima
Belço e paxão sem fim.
No colo do sertão
Fico quitim!
Sô obidiente
E amo meu cantin.
Assunta!
É o berrante do meu avô
Raimundo Cavuquêro
Nêgo labutadô.
Me alembro dele
Da vó Binidita
Meu padrin de batismo
Pai da minha mãe Nita.
Sô inraizado!
Pé rachado e lutadore
Meu agasaio é o sertão
Dele a essença dos amore.
No colo do sertão
Tô no colo de DEUS!
Vô dexá essa impreitiada
Pros fio e netos meu.
No colo do sertão
Sô um home filiz
No colo do sertão
Minha álima raiz!
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