Em Busca da Solução

Em Busca da Solução

 

Havia três noites que Francisquito não conseguia dormir, o que, entre outras coisas, lhe vinha prejudicando o rendimento escolar, que até ali sempre fora excelente e, agora, começava a resvalar para índices preocupantes. O professor, sempre tão encantado com o bom desempenho do seu aluno, entendeu não deixar arrastar o problema por mais tempo, até porque se aproximava a época de exames, e chamou o pai de Francisquito à escola:

- Então que se passa, assim de tão grave, senhor professor? Sim, porque só pode tratar-se de algo muito grave, visto que nestes anos que leva como professor do meu filho, nunca me chamou fora das reuniões normais.

- Sabe, senhor Francisco, foi com muito custo que aqui o chamei, mas entendo ser essa a minha obrigação enquanto professor do Francisquito.

O pai, ao ouvir tudo quanto o professor do filho lhe contava, também foi dando mostras de ficar preocupado:

- Pode ficar descansado, senhor professor. O meu filho, pelo menos até hoje, e ponho as minhas mãos no lume, nunca me mentiu. Assim que ele chegar a casa, vou ter uma conversa muito séria com ele.

- Permita-me que acrescente só mais uma coisa. Aqui há uns três ou quatro dias, logo após eles terem saído para o intervalo, fui atrás deles, sem se aperceberem, e ouvi uma coisa que me deixou de pulga atrás da orelha. O Francisquito estava a dizer, a um outro menino, que a mãe teimava em só lhe mandar pão com marmelada, mesmo sabendo que ele não gostava de marmelada, e não é que deu o lanche dele ao outro.

O pai admirou-se com tudo aquilo, voltando a prometer ao professor que iria averiguar. Se bem o prometeu, melhor o fez.

Francisquito, não sabendo da ida do pai à escola, chegou a casa, deu um beijo ao pai, outro à mãe, e disse que ia lanchar. O pai, nada dizendo, foi espreitá-lo. Francisquito agarrou num bom pedaço de pão, abriu-o ao meio, recheou-o, bem recheado, com marmelada e devorou-o:

- Meu filho, precisamos ter uma conversa muito séria. Sente-se aqui na perna do pai como tanto gosta.

A mãe de Francisquito, sabedora de tudo quanto o professor contara ao marido, puxou uma cadeira, sentou-se e preparou-se, como era hábito corrente, para assistir à conversa entre pai e filho:

- Pai, o que se passa, apesar de ser muito simples, é mais complicado do que se possa pensar. O Miguel, o menino a quem tenho dado os meus lanches, nunca leva lanche para a escola e quando era a hora do intervalo, escondia-se de nós. Um dia, perguntei-lhe porque nunca levava lanche e ele disse-me que não tinha o hábito de lanchar. Não acreditei e no dia seguinte resolvi dizer-lhe que a mãe me tinha mandado pão com marmelada mas, como eu não gostava de marmelada, perguntei-lhe se ele queria o meu pão. Pai, mãe, se vocês vissem em quanto tempo o comeu. O Miguel passa fome. Não tenho dormido a pensar como ajudá-lo.

- Porque não falaste connosco? Ou com o teu professor?

- Porque o Miguel é muito complexado, tive medo que o professor lhe fosse perguntar alguma coisa e ele deixasse de ir à escola com vergonha.

A mãe, que se mantivera em absoluto silêncio, agarrou-lhe nas duas mãos e disse-lhe:

- Filho, hoje já podes dormir descansado. Eu e o pai vamos pensar numa maneira de ajudares o teu amigo.

Nessa noite, Francisquito, mais aliviado por ter contado aos pais e por saber que poderia contar com a ajuda deles, dormiu como há muito não dormia.

No dia seguinte, ao abrir a sacola para tirar o lanche, ficou com um sorriso de orelha a orelha, a mãe metera-lhe, não uma, mas sim duas grandes sandes de marmelada e duas garrafas de leite. Correu até junto de Miguel, não lhe disse nada, mas como já vinha sendo costume, deu-lhe a sande que supostamente seria para ele, a qual desapareceu num ápice na boca de Miguel.

 

Moral: A pureza de sentimentos de uma criança, não move montanhas, mas muda o mundo.

 

Francis Raposo Ferreira

11/01/2020

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