GAIOLAS

No pequeno alpendre, a mesa e seis cadeiras
Uns bancos malfeitos com restos das madeiras
Reaproveitadas das destocas do terreiro.
Sobre a mesa maçãs, folhas, flores e jarros
Desenhados na toalha plástica cheia de poeira.
Lembro ainda dos palitos queimados
E guimbas amassadas, dos palheiros pisados.
Logo à frente um risco de agua vazado da torneira
Das galinhas ciscando sobre as próprias fezes
E dos cachorros e gatos deitados na soleira.
Roseiras plantadas em canteiros separados
Por tijolinhos enterrados na diagonal.
Cascas de laranjas, pés de mamão macho
E os portões tortos amarrados
Junto aos mourões das cercas escangalhadas
Entre touceiras de mato, guariroba e pimenteira.
Um silêncio lascado se estendia pelas ruas do milharal
Cujas bonecas tagarelavam ou dormiam quietas
Transtornadas de gostosa meiguice.

Era apenas domingo, dormiam, ninguém trabalhava.
Os parentes viriam de novo somente no Natal.
Enquanto isso o presente era a saudade e a velhice.
Nós? Assistíamos a tudo de dentro das semiabertas gaiolas
Penduradas por pregos à sombra, nas paredes.
Comíamos restos, matávamos a sede.
Recordo daquela vida como fosse agora:
Cantávamos solidários blues desafinados
Alimentando os sonhos daquela gente da roça
Até que batessem asas para o mundo
E aprumados como nuvens livres
Em busca das cidades torpes fossem embora!

PSRosseto

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Paulo Sérgio Rosseto

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Comentários

  • Há momentos que o passado chega como se fosse presente sendo vivenciado naquele instante em que a mente passeia por suas avenidas.

    Belíssimo poema, Paulo.

    Aplausos!

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