Novos Contos de Natal da Matilde 2019 – 08

 

Surpresa

 

 

O avô Martinho, sem dar qualquer sinal disso, ia estudando o comportamento da neta, ao mesmo tempo que ia inventando pequenas histórias de Natal que também pudessem ser verdadeiras lições para a vida:

- Avô, quero confessar-te uma coisa.

- Sério, netinha do meu coração?!Já te disse que és a minha neta preferida?

- Não. Ah, mas também não precisas, eu sou a tua única neta.

- Pois é verdade, já me esquecia. Afinal, o que queres confessar-me?

- Eu tenho andado a tentar acertar com a folha certa do teu livro, e acho que hoje, ao fazer como ontem me ensinaste, estive quase, quase, a abrir o livro logo na folha certa. Vou ter de esperar mais alguns dias até poder comprar as prendas de Natal.

- Acho que ao procederes assim, com lealdade e paciência, estás muito próxima de o conseguir. Como te contei, trata-se de um livro mágico, pelo que consegue saber qual o comportamento das pessoas.

- Avô, eu tenho andado a enganar-te, se calhar é por isso que ainda não consegui acertar com a folha certa, quando eu te dizia que estava com sono e me queria ir deitar, isso não era bem verdade, pois o que eu queria era que a noite passasse depressa para vir a correr abrir o livro. Algumas noites, porque pensava que eras tu que ias pôr o dinheiro no livro, esperei que tu e a Bela se deitassem e depois vim em bicos dos pés, ver o livro.

- Sabes uma coisa, minha marota, acho que ao revelares essas tuas pequenas fraquezas, te estás a aproximar de um verdadeiro milagre de Natal. Mas não penses que me enganas, eu bem tenho visto os teus olhinhos de sono, quando não adormeces mesmo no meu colo, ou vais-me dizer que também estavas a fingir nessas alturas.

- Não. A verdade é que eu talvez até tivesse algum sono, só não teria era assim tanto.

-Bem, isso agora pouco importa, pois o mais importante é teres revelado toda a verdade.

Bela, a avó nova, apesar de concentrada na sua leitura, não deixava de admirar como o avô Martinho conseguia dar a volta ao texto e fazer com que a neta, sem se aperceber disso, fosse interiorizando os verdadeiros valores de uma vida de verdade e lealdade para com todos, principalmente consigo mesma.

- Avô, achas mesmo que ainda vou a tempo de conseguir um milagre de Natal?

- Creio que sim. Pelo que sei do livro do dinheiro, ele costuma ser muito benevolente para com quem confessa os seus comportamentos menos certos. Agora tens é de saber esperar, pois não acredito que o livro te vá dar essa felicidade assim tão depressa, mas como estamos na quadra de Natal, tudo é possível.

No dia seguinte, Matilde, ao contrário do que vinha fazendo, esperou que o avô e Bela se levantassem, só depois descendo:

- Avô, já abriste o livro, hoje?

- Não. Nem me lembrei disso.

A pequenita correu em direcção à estante onde estava o livro mágico, agarrou-o, olhou bem na frente das folhas, depois olhou-as por cima e, por último, por baixo, mas não lhe pareceu ver nada de diferente em nenhuma delas, pelo que decidiu abrir numa qualquer:

- Que foi isso Matilde?

- Isso o quê, avô?

- Pareceu-me ouvir papel a amarrotar-se. Devem ser coisas da minha cabeça.

- Não. Acho que também senti a nota a desaparecer. Sabes que acho que foi por muito pouco.

No dia seguinte, tudo se repetiu até a menina pegar no livro, olhá-lo de frente e parecer-lhe ver uma abertura ligeiramente maior entre duas das folhas. Abriu o livro e soltou um grito de alegria:

- Avô! Bela! Consegui. Consegui 20 euros.

Bela olhou para o avô Martinho e sorriu-lhe, como que a dizer-lhe: “Muito bem”.

Matilde nem queria acreditar, a história do livro dar mesmo dinheiro, não era nenhuma invenção do avô. Só que este também não compreendia o que se passava, pois não fora ele que lá pusera a nota. Olhou para Bela e esta fez-lhe sinal que jurava não ter sido ela.

Não era só Matilde que se sentia incrédula com o que acabava de suceder. Bela tinha a certeza que só podia ser obra do avô Martinho, mas este também tinha a certeza que só podia ter sido ela.

 

Francis D’Homem Martinho

08/12/2019

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