Novos Contos de Natal da Matilde 2019
16 - O Pai Natal.
- Avô, esta noite dormi maravilhosamente bem, conta-me outra história de Natal com um final como o de ontem.
O avô, percebendo o que a neta queria dizer, não se fez rogado, pois histórias com uma moral forte no fim, era o que mais gostava.
David, um miúdo na força dos seus sete anos, era oriundo de uma família muito pobre, talvez a mais pobre da sua aldeia, pelo que as suas prendas de Natal eram sempre coisas que muito jeito, lhe dariam no dia-a-dia, um pijama, um casaco, umas calças, etc.
O pai de David emigrara há alguns anos para o Brasil, pelo que o último Natal que passara com o filho já distava três anos. A mãe, que deitava mão a tudo que lhe pudesse ajudar a atenuar a constante falta de dinheiro, trabalhava no campo, caiava as casas dos vizinhos, tratava do gado e tudo mais o que lhe fosse oferecido, pelo que pouco tempo tinha para estar com o filho.
As noites eram demasiado curtas para recuperar energias, o que fazia com que deitassem sempre muito cedo. Havia, no entanto, uma coisa que Maria Adelaide sempre fizera questão, principalmente depois do marido partir para o Brasil, passar a noite da consoada acordada até que o filho se deixasse vencer pelo sono. Nesse momento, Maria Adelaide vestia um fato de pai Natal, que ela mesma confecionara, escapava-se sem acordar o filho, saía e batia à porta imitando o tão querido velhinho.
Mas neste ano, ah neste ano, David iria receber o presente com que todos os meninos sonham, todos quer dizer, aqueles que não o têm. Estavam ainda a jantar, era sempre a mesma coisa na noite da consoada, bacalhau com natas, o prato preferido de David, quando ouviram bater à porta. Trocaram olhares. Quem poderia bater à porta àquela hora, principalmente com o mau tempo que se fazia sentir naquela aldeia perdida na serra. David sentiu medo e correu para o colo da mãe.
Maria Adelaide perguntou quem era. A única resposta que obteve foi novas duas pancadas no batente da porta. Levantou-se, agarrou na longa pá do forno onde cozia o pão, e dirigiu-se à porta:
- Quem é?
Uma voz meio rouca respondeu-lhe:
- Pai Natal.
Maria Adelaide, tão assustada quanto o filho, abriu o pequeno postigo da porta e viu uma cabeça com farta cabeleira branca, tal como as longas barbas:
- Mas que brincadeira é esta!
O homem estendeu-lhe um embrulho e disse-lhe:
- Sei que este ano não tiveste tempo para comprar uma prenda para o teu filho, por isso vim trazer-lhe uma.
O homem afastou-se sem mais palavras:
- Quem é, mãe?
- É o pai Natal, vem cá depressa.
David correu para a mãe, esta abriu a porta e gritou:
- Pai Natal, queres jantar connosco?
- Sim.
Jantaram os três. David estava encantado, tinha a história mais linda para contar aos amigos. Até resistiu mais do que era costume ao avanço do sono. No dia seguinte, ao saltar da cama, apercebeu-se que a mãe não estava sozinha, foi pé ante pé, mas não conseguiu esconder o seu espanto:
-Pai. Pai. Que bom que pudeste vir. Só tenho pena que não tenhas podido vir mais cedo. Sabes quem jantou cá em casa, ontem à noite?
- Não. Quem foi?
- O Pai Natal. Eu vi o Pai Natal.
David aninhou-se no colo do pai:
- Sabes uma coisa pai?
- Não. Diz lá.
- Sempre sonhei poder ver o Pai Natal ao vivo, mas se, ontem à noite, me dessem a escolher entre jantar contigo ou com ele, eu escolhia-te a ti.
Moral: Se o sonho é que comanda a vida, o sangue é que nos permite viver essa mesma vida.
Francis Raposo Ferreira
16/12/2019
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