Tina

Tina

 

Tina é uma bela morena, cujas perfeitas formas nunca passaram despercebidas a Jorge, o morador do apartamento situado mesmo poe baixo do seu, ou seja, 8º Esq.

Jorge, desde que se mudou para o mesmo prédio da atraente vizinha e depois de se ter sentido atraído pelas curvas corporais de Tina,  já por várias vezes conseguiu arranjar maneira de subirem em conjunto no elevador, aproveitando o tempo da subida para a apreciar melhor, algumas das vezes de forma bastante descarada, o que também parece não a ter incomodado por aí além, habituada que estás a ser olhada com olhares de gulosice.

Tina, assim que o tempo aquece um pouco, não se inibe, nada mesmo, de usar generosos decotes que lhe deixam uma boa parte dos seios mesmo à mercê do olhar do vizinho, bem como calças justas que lhe moldam o corpo na perfeição, ou arrojadas mini-saias que lhe deixam as bonitas pernas quase todas à mostra.

Jorge, ao contrário da vizinha, é solteiro e não se lhe conhece namorada, embora até nem seja nada de deitar fora. Seja de inverno ou de verão, dia de trabalho ou de descanso, logo ao romper do dia, é vê-lo em longas caminhadas, além de não descurar a dieta que lhe permite manter toda a boa forma física que faz questão de exibir, principalmente quando está na presença de Tina.

Ao contrário da esposa, o marido de Tina, homem aparentemente bem mais velho que ela, parece não sentir grande simpatia pelo jovem vizinho, sentimento que, nota-se bem, é reciproco. Jorge sabe que se trata de um engenheiro naval que passa algumas temporadas longe de casa, o que já o levou, por várias vezes, a sonhar com a vizinha a sentir-se muito sozinha e a convidá-lo para lhe fazer companhia.

Talvez seja o desejo de se poder cruzar com ela, ou melhor dizendo, de lhe poder fazer companhia na subida até ao 8º andar, que, no final de cada dia, o faz correr do emprego para casa, sempre na esperança que um qualquer destes dias, ao chegarem ao piso onde deverá sair, Tina lhe diga “Não queres subir mais um piso? O meu marido está fora.”

Os dias vão passando, as subidas em conjunto vão-se somando umas às outras e de convite para subir até ao 9º andar é que nem sinal. Uma noite, em que ele sabe que o marido de Tina não se encontra em casa, parece-lhe ouvi-la gritar por socorro. Corre para a porta, sobe os degraus que o conduzem até à porta dela, tudo lhe parece tão tranquilo como sempre tem sido costume. Pensa que poderá ter sido o seu subconsciente que o traiu, fazendo-lhe ouvir aquilo que ele tanto deseja e não a realidade, até porque essa não se poderia fazer ouvir, é um silêncio absoluto.

Começa a descer as escadas quando ouve a porta de Tina abrir-se, esconde-se atrás da parede da caixa do elevador e vê sair um homem todo muito bem vestido, ainda como que a acabar de se vestir, o que o levou a pensar que ali estava a principal razão para ela nunca o ter convidado a subir, já tinha um substituto para as ausências do marido.

Jorge entrou em casa, dirigiu-se ao bar, agarrou numa garrafa de Whisky e enquanto a esvaziava ia arquitectando um plano para se vingar daquilo que considerava ser uma traição por parte de Tina, então ele estava ali mesmo ao pé da porta e ela tinha a pouca vergonha de ir escolher outro para seu amante. Não, não iria aceitar isso com bons olhos, ela iria pagar-lhe tal desfaçatez.

Jorge só parou de beber quando deixou cair o corpo sobre o sofá e adormeceu. Adormeceu ou entrou em estado de coma profundo, tal a quantidade de álcool que ingerira e que o impediria de se aperceber tudo quanto ainda se viria a passar nessa mesma noite.

Se até aquele dia, Jorge, tudo fazia para se encontrar com Tina à entrada para o elevador, agora passa-se precisamente o contrário, o rapaz sente-se despeitado com aquilo que considera uma traição no seu direito de ser o escolhido para amante da vizinha.

Tina, estranhando nunca mais ter visto o jovem, decide suspender a marcha do elevador no 8º piso, em vez de o deixar subir até ao 9º, e vai tocar à campainha de Jorge:

- Boa noite, está tudo bem contigo?

- Claro que sim, porque não haveria de estar?

- Nada. Só estranhei nunca mais te ter visto. Já sabes o que aconteceu?

- Porquê, será que a vizinha sentiu saudades minhas? Não me diga que o seu amante a trocou por outra. Não, não sei o que possa ter acontecido, mas também pouco me importa.

Tina, apercebendo-se da frieza com que ele se dirige a ela, decide não adiantar mais nada. Despede-se com um tímido “Desculpa a minha ousadia por te ter vindo incomodar. Tem uma boa noite” e ruma a casa.

Passados alguns dias após a visita de Tina, Jorge, ao entrar no prédio, prepara-se para subir os três degraus até ao elevador, quando uma outra vizinha o interpela:

- Pois é, é por causa das pessoas não se preocuparem, em fechar a porta é que aconteceu o que aconteceu à pobre da vizinha do 9º.

Um alerta soa no cérebro de Jorge:

- Desculpe, que foi que aconteceu à vizinha do 9º?

- Não me diga que não sabe. Se calhar até a ouviu gritar por socorro e nem se preocupou.

Jorge sente o chão a fugir-lhe debaixo dos pés:

- Mas afinal o que é que aconteceu?

- Ora o que é que aconteceu! Foi um malandro qualquer que deve ter andado a estudar os movimentos do marido dela e numa destas noites em que ela estava sozinha em casa, lhe entrou porta dentro, usando uma chave falsa, fez dela o que bem lhe apeteceu e ainda lhe roubou todo o dinheiro e ouro que ela tinha em casa. Não ouviu mesmo nada?

Jorge já nem lhe consegue responder, de tão mal que que sente consigo próprio e com a sua consciência. Sobe até ao 9º andar, toca à campainha de Tina, tem a certeza que ela está em casa, pois consegue aperceber-se da presença dela a espreitar pelo visor da porta, mas esta nunca se abre aos seus toques.

 

Moral: Quem julga sem procurar saber a verdade, corre o risco de julgar em falso.

 

Francis D’Homem Martinho

22/01/2020

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Comentários

  • 3636029?profile=RESIZE_710x

  • Uau!!! Totalmente inesperado!!

    Parabéns Francis!!! 

    DESTACADISSIMO!!! 

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