Deleção
J. A. Medeiros da Luz
Repiso velhos caminhos ensombrados.
Nesta árvore nodosa
De harto caule, imemorial,
— Diga-me, Olegária, onde
Se escondem os nossos nomes,
Tendo por envoltória, tatuado
Em baixo-relevo, aquele coração;
Simulacro lógico dos tais
Cartuchos hieroglíficos,
A encapsular os designativos
De avelhantados faraós?
Ao contrário dos granitos, todavia,
O súber recompôs-se no decurso
Das décadas, essas apagadoras de ilusões,
Regeneradoras de floemas,
Multiplicadoras de calos e vivências,
Arrasadoras de calombos e quinas e arestas.
E isto constatando, minha cara,
Na fugacidade do instante em que retorno
A esta mesma praça de recreio e suspiros,
Eu (o seu velho Faustino)
Pergunto —entre ecos do passado —,
Pergunto, indago, inquiro afinal:
Onde está você, doce Olegária?
Em qual bifurcação de vias
Bifurcamos as nossas trajetórias?
Ouro Preto, 07 de novembro de 2022.
[Comentos também podem ser dirigidos a: jaurelio@ufop.edu.br ou jaurelioluz@yahoo.com © J. A. M. Luz]
Comentários
Maravilhoso texto! Escrito com toda maestria que lhe é peculiar.
Parabéns,J A!
DESTACADO
Um abraço
Minha cara Mancebo:
Obrigado pela visita e pela gentileza.
Aproveito a deixa para acrescentar, na categoria das confidências de Polichinelo, que a eleição dos nomes empregados no poemeto mirou propositalmente uma retrogradação a décadas no passado; tendo sido o masculino matizado com alusão, não muito discreta, ao emblemático mito do Fausto, com aquela sofreguidão para transcender aos nossos limites, a todo custo...
Abraço; j. a.
Quanto maravilha poética adorável e bela. A s arvores são primordias para a vida do nosso ambiente
Muito obrigado pela visita e comentário generoso, prezado José Carlos.
De fato, a magia que uma fronde hospitaleira nos suscita torna imprescindível a sua proximidade, para a nossa reenergização. E sendo essa árvore testemunha de nossos devaneios e arroubos, ainda que estejam já imersos na bruma do passado, ela se transfigura na melhor das confidentes: discreta e reconfortante.
Abraço; j. a.
Uma homenagem a velha árvore que sobrevive ao tempo ali desgastada pelo tempo em meio a poluição diversas.
Lindos e criativos Versos, Bela Poesia.
Parabéns prezado Medeiros
Abraços de Antonio Domingos
Parabéns
Agradecido com a visita e comentário, caro Antonio Domingos.
As velhas árvores, nossas caladas companheiras citadinas, que nos guardam segredos e suspiros! Fazem parte de nosso imaginário coletivo.
E, no caso presente, eis aí abaixo a gênese primária dos versos que o escrevinhador rabiscou sob formato de bits do ciberespaço, em vez de agregá-los na casca já calejada de paixões do velho tronco. Quando saquei esta foto, tinha em mente um lembrete para futuro indeterminado; só não contava que a fileirinha dos versos me atropelaria nesta madrugada, irrequietos como corcéis criados no bravio das restingas e capoeirões deslimitados. 👇🏽
Abraço do j. a.
Excelente reflexão poética
Agradecido pela visita e comentário, cara Norma.
Com efeito, o tema dos desencontros existenciais sempre será candente. E que ele, por fim, não nos venha a entristecer — mas que seja, antes, um relato (um daguerreótipo, um holograma) da multitude das experiências do viver, as quais nos fazem a nós o que hoje somos (mais exatamente o que hoje estamos...).
Da feitura do poemeto, confidencio que tomei emprestado — a título de resgate de esquecida antroponímia — o nome que vi de uma artesã hispanoparlante, num pequeno documentário acerca da técnica da cerâmica negra colombiana.
Abraço do j. a.
Pessoal:
Deambulando, em caminhos de lembranças, pelo centro de B. H., neste sábado, calhou-me de cruzar com velhas árvores que guarnecem o Santuário de São José, em cujos troncos nodosos se viam os encontradiços resíduos de juras, já quase delidas de todo pelo regenerar das cascas, verdadeiros palimpsestos amorosos. Daí para o poemeto pipocar no subconsciente, esperando oportunidade de se derramar em papel desavisadamente distraído, foi um átimo. E tenho dito.