Posts de RODRIGO LUCIANO CABRAL (234)

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QUANTAS?

 

Quantas verdades eu perdi?
Sabe aos 12 anos?
Acreditando em monstros nas matas...
Em maldições de sexta feira santa...
Quantas ilusões eu já vivi?
Eu vi amor em alguns sorrisos
Eu vi afeto em outros olhares
E o que eu vi... não tive!
Quantas traições eu já sofri?
Amendoados olhos com segredos...
Noites rubras no teu vinho
Sereno e lua!
Fugaz foi o vento
Foi o sonho...
Fugaz não foi à dor
Nunca é a dor!
Nunca é
Quantas escolhas eu já tive?
As que perdi são só memórias
As que acertei por vezes nem lembro
E das erradas... Das erradas não esqueço
Quantos segredos eu guardei?
Andei na chuva tão calado
Pensando na alcova que abandonara
Tal e qual cetim com sangue me sentia manchado
Sujo... obsceno !
Mas jamais contei...
Quantos segredos eu partilhei?
Com que coragem a ouvidos estranhos...
Na penumbra fria de minha solidão
Na minha porta assoviando o vento do desespero
Sem amigos naquelas noites...
Sem amigos...
Sem amor...
Sem ninguém...
Quantas pessoas eu destrui?
De alguma forma ainda que um pouco que seja?
A duros golpes ou sutis ardis...
Corações partidos em minha estrada
Sorriso vazio nos lábios a avançar
Só os olhos traindo meu medo
A noite cai e é noite fria
La fora o vento do sul me diz que não importa
O mundo seguiu e não vai voltar
A idade que eu tenho não permite recomeços...
Talvez nem haja mais nada pra recomeçar
La no céu eu sei a lua me ignora
Da janela eu vejo as formas da noite
Suspiro...
Sem cigarros, sem vinho, só café.
De ouvidos cheios do meu próprio lamento
E a pergunta que não para...
Quantas verdades terei perdido?
Quantas?

RODRIGO CABRAL

 

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DA SERIE TANTAS VOZES NA CIDADE(DONA CHICÓRIA)

Dona Chicória Spiga era muito feliz...Casou com Josia...casal perfeito diziam todos os vizinhos e parentes...bom homem o seu Josia, ficava violento quando bebia um pouco...mas so bebia de segunda a sábado...dia de domingo era santo...bebida só o vinho da missa , Dona Chicória era feliz com o seu Josia...apanhava um pouco mas tinhas seus filhinhos né? 12 lindos anjinhos que ela se ocupava em vestir e educar com sua vara de marmelo bravo...e como era rígida a educação de Dona Chicória principalmente apos uma bebedeira do Josia...mas ela era muito feliz...hoje você pode vê-la na fila da penitenciaria no dia de visita...5 dos 12 anjinhos moram la agora...seu josia ta mudado o AVC não deixou mais animo pra beber...nem pra sair da cama...mas dona Chicória? Ha se vc perguntar ela ainda ta muito feliz...Boa gente os Spiga.

RODRIGO CABRAL

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ÕNIBUS AMARELO

Era quase madrugada, não sei a hora, uma, duas? Nem isto... não sei.
Mas lembro com clareza que eu estava na cozinha de casa, sozinho, dos quartos eu podia ouvir meus pais e irmã dormindo, uma sinfonia feia de roncos e peidos ou uma competição talvez!
Só lembro que pelo que eu podia ouvir o vencedor permaneceria indefinido por muito tempo.
Na pia inox velha e amassada a torneira pingava incessante, nem por borracha nem dar reaperto nada resolvera aquele problema, na verdade todos nos sabíamos qual era a solução, comprar uma nova, simples assim!
Só que não se podia gastar com algo tão pouco essencial na verdade mesmo que a droga da torneira se se desmancha meu pai ainda não gastaria com uma nova, em algum lugar ele conseguiria uma torneira velha pra por no lugar.
Era neste tipo de mundo que eu sentia que vivia! Um mundo de segunda mão um mundo reaproveitado, de sobras e rejeitos. Pratos velhos, talheres de mil tipos diferentes, ganhados, comprados, achados, roubados nem sei... uma miscelânea de facas garfos e facas que não combinavam, panelas amassadas copos de extrato de tomate ou requeijão.
Nossos botijões de gás eu chamava de zumbis, pois sempre se arrancava deles uma sobrevida mesmo quando já se havia dado como mortos. Deita-los não chão virar de ponta a cabeça, mil truques pra garantir que o sacrifício de se gastar com um botijão novo só seria feito depois de o velho ter sido sugado ate a última preciosa gota possível.
Roupas rotas, compradas em brechós ou quando muito nas lojas mais populares da cidade, tênis artigo de luxo só comprado nos mesmos lugares ou ganhados por quem era abastado.
Eu odiava aquela maldita miséria filha da puta em que vivia. Odiava ver meu pai pedreiro trabalhar como um cavalo 12 horas por dia pra ganhar uns trocados que mal nos mantinha, odiava ver minha mãe peregrinando pelos corredores do supermercado em busca de itens que pudéssemos pagar, peregrinando por vários mercados para conseguir a ínfima e sempre insuficiente compra do mês, odiava meus cadernos e a mochila puída com que ia a escola.
Sentia o sangue ferver em puro ódio adolescente quando via os garotinhos bacanas da escola esbanjando dinheiro na compra de lanches durante o intervalo com suas roupas de marca e tênis caríssimos, descendo dos enormes carrões dos pais na frente da escola.
Eu os odiava mortalmente. Sentado ali naquela cozinha após mais um dia de aula sofrível em que tirei notas ruins e me senti humilhado quando a professora propôs um passeio no mês que viria ate a cidade vizinha, mas fez um parêntese (olhando diretamente pra mim) que quem não tivesse condições de arcar com o custo não se preocupasse que a escola cuidaria de tudo.
Sentado ali lembrando da expressão nos olhos dela, lembrando de todos aqueles olhos voltados pra mim, garotos e garotas entre 14 e 16 anos me fitando como quem olha uma curiosa forma microbiana no microscópico eu senti o mais puro e incontrolável ódio de toda a minha vida.
Eu quis morrer na sala de aula naquela maldita tarde, eu quis morrer, mas não sem antes arrancar aqueles olhos um por um dando especial atenção aos olhos da professora.
Voltei pra casa calado à mente zumbindo em ondas crescentes, ignorei a todos no caminho, ignorei os poucos amigos que tinha, pobres diabos como eu em sua maioria, minha irmã foi inteligente o bastante pra voltar calada a meu lado, era petulante e provocadora, mas não era besta viu logo o ódio no meu olhar se ficou na sua.
Em casa minha mãe estava ocupada lavando roupa pra sei La quantas pessoas meu pai estava no trabalho como sempre, no fogão nosso almoço, arroz com feijão e salsicha ela nem notou nossa chegada, eu não comi, joguei a mochila no quarto e sai de novo pra rua, em frente a nossa casa em um terreno baldio já pontilhado de lixo havia uma arvore, não sei o que ela era, mas eu subia nela quando precisava de solidão.
E naquela tarde eu precisei mais do que nunca!
Perdi a noção do tempo empoleirado La, imaginando mil formas violentas de responder a professora e a todos aqueles merdas da escola, uma forma de responder ao mundo inteiro.
Sangue dor e enxofre em minha mente.
E acima de tudo vergonha.
Quando desci de La já escurecera meu pai já estava em casa e ninguém como sempre dera por minha falta, ele trocou poucas palavras com minha mãe e ainda menos comigo, estava já de banho tomado, mas tinha hálito de cachaça, meu pai jamais ficara bêbado nunca o vimos sequer mais alegrinho, mas não dispensava uma dose diária no boteco, imagino que era sua forma de suportar a vida que vivia! Eu não culpava!
Mas ver aquele homem rotundo de barba por fazer e cheiro de bebida sentado no sofá da sala vociferando contra o noticiário não conseguia me encher de orgulho.
Naquela tarde senti náuseas.
Belisquei o jantar (o mesmo almoço requentado) e apenas por o desperdício de comida ser sacrilégio entre nós minha mãe questionou-me sobre eu não estar comendo. Resmunguei que estava sem fome e o assunto não foi longe.
Meus pais foram pra cama cedo como sempre, minha irmã certamente preparou-se para nossa disputa de todas as noites sobre quem veria o que na TV, mas eu não queria ver nada, fui sentar na cozinha sozinho, pude ver no olhar dela a uma vaga nota de preocupação, mas a TV seria toda dela e isto e que importava.
Não sei ao certo como o tempo passou, apenas fiquei La sozinho espiando a lua pelo janelão rachado da cozinha ate não mais ouvir a TV e ainda estava La muito depois disto. Vendo e revendo minha vida, e sempre voltando ao mesmo pondo em que a professora me garantia que os miseráveis também poderiam passear.
Eu apertava com tanta força um copo em minha mão que quase o quebrei, só me dei conta de que chorava quando as lagrimas começaram a empapar minha camiseta.
Chorei calado naquela cozinha infernal por muito tempo. Quando o dia nasceu eu já havia tomado uma decisão.
Calado mas sem particularmente me preocupar se acordaria alguém fui ate o quarto e tirei da mochila os cadernos e livros, pus roupas a esmo dentro dela debaixo do meu colchão peguei minhas economias, dinheiro ganho em pequenos serviços a vizinhos, moedinhas achadas na rua, cada maldito centavo que eu podia segurar, e que ainda assim mal davam 30 reais.
E sai da casa caminhando rápido quase correndo.
Eu ia embora, ia pra qualquer lugar não importava nem sabia onde, mas eu ia.
Ia botar pra foder no mundo, matar ou ser morto se precisasse.
Mas nunca mais filha da puta algum ia me olhar com piedade nos olhos a menos que quisesse ficar sego depois.
Eu só sabia que tinha que fazer isto longe de casa.
No caminho para a estação rodoviária passei pela igreja, o dia já ia algo e ela estava aberta.
Não resisti, entrei, caminhei ate o altar estava sozinho, tudo quieto, fiquei cara a cara com Jesus em sua cruz, por um tempo só olhei pra ele, o filho de Deus, ou era o pai? Ou era ele o próprio Deus sinceramente eu não via a diferença, e num rompante incontrolável sem ligar para quem quer que pudesse me ouvir eu berrei minha pergunta pra estatua do messias.
- Porra pra que tu me pôs nesse mundo hem? Que merda do caralho ta tentando me provar?
Chafurdar na bosta destes filhos da puta endinheirados é pra ensinar o que?
Aguardei uns 5 minutos olhando pra Jesus punho ainda erguido mão apertada esperando minha resposta.
Ele não respondeu no que me dizia respeito era provável que nem tivesse ouvido, ate onde eu sabia ele nem ligava. Sai da igreja e fui direto a rodoviária. Chegando La escolhi o lugar mais longe em que meu dinheiro dava pra pagar e comprei a passagem.
Sentado no terminal aguardando a hora de sair eu observava as pessoas, velhos e jovens, homens, mulheres, mães e pais e crianças caminhando pra La e pra Ca barulhentos como insetos numa caixa.
Não muito longe de mim eu via uma prostituta insinuando-se para um cara, ela o deixava olhar a vontade seu decote e não ligava que ele metesse a Mão a vontade nela, era dia claro já, mas a puta ainda sim tinha que ganhar o seu pra comer.
Meu ônibus encostou, era muito velho e pintado num amarelo descascado que um dia fora amarelo ouro. O motorista desceu e anunciou que o ônibus saia em 10 minutos.
Agora faltava pouco.
Mas comecei a sentir cheiro de cagada.
Como na famosa situação em que a vida toda passa diante dos olhos eu revi a minha de novo. E o cheiro de cagada só aumentava.
Comecei a pensar no monte de cagadas que tinha feito ate ali.
E no monte de cagadas que eu ainda podia fazer.
E na cagada maior pra onde este ônibus ia me levar.
La pra onde eu não teria guarida nem pátria.
Eu me sentia chafurdando na merda
E estava prontinho para buscar uma quantidade maior onde me enfiar.
Era forte muito forte o cheiro da cagada.
O ônibus amarelo saiu no horário.
Eu não peguei.

RODRIGO CABRAL

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AS MESMAS COISAS

A tarde chegara em lento avanço
Ventava do leste
Um céu de chumbo sobre o litoral
Do velho álbum antigos retratos espiavam a luz difusa da hora vespertina
Dois drinques sobre a mesinha de centro
Musica suave no radio
Seria Chico Buarque?
A graciosa poltrona em tom verde a acomodara com conforto
Ainda com conforto...
Mãos cruzadas sobre as cochas e olhar ansioso
Voltara pra casa...
Nas paredes os mesmos quadros ostentando paisagens irreais
Ilhas de éden...
Batalhas medievais...
Na estante os livros continuavam como antes
Pacientes esperando pra contar de novo suas estórias
Num cantinho ainda estava complacente a estatueta de Buda
Destoando da decoração teimosamente
No chão ainda o tapete de pelo alto e cor neutra
A casa pouco mudara
Havia naquele ambiente um antigo mundo que o progresso do tempo não tocara
As mesmas coisas...
Tudo igual diziam a ela seus olhos
As mesmas coisas...
Então ele entrou na sala vindo da cozinha
Olhos escuros como a noite sem estrelas
Barba por fazer
Na boca nenhum sorriso
Era um rosto cansado
Não era feroz
Era triste...
Era duro...
Silencioso sentou-se diante dela
Frente a frente olhos nos olhos
E então ela soube...
As mesmas coisas...
Tudo igual...
Sentiu que perdera uma importante batalha
As mesmas coisas...
Sim...
Tudo igual...
Apenas ele mudou.

RODRIGO CABRAL

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A CONVERSA QUE NÃO TIVEMOS!

Nos não conversamos na ultima vez que a vi ...
havia algo naqueles olhos azuis tão límpidos que me dizia que estávamos alem das palavras...
eu apenas apertei suas mãos inchadas e e afaguei seus cabelos ...
quando beijei sua testa como sempre o fizera senti que estava fria...
imediatamente lembrei de nossa ultima conversa ao telefone...
minha mãe em voz entrecortada dizendo..."a dor vem...a dor vai...mas vai passar filho...vai passar"
quando afastei meus lábios do beijinho que lhe dera fitei novamente aquele olhar dela
não importava a dor o desespero ou o cansaço ...ainda era o olhar mais lindo que ja vi...
tentei sorrir com os olhos marejados(chorar na frente dela nunca foi um opção entendam)
ela apenas me olhava silenciosa e sibilante ligada ao oxigênio
repetia na minha minha mente freneticamente a frase dela
"vai passar....vai passar"
eu sai do quarto prometendo voltar mais tarde...
no corredor dei vazão ao meu desespero num choro convulsivo que me fez errar o caminho dentro do hospital
uma pessoa me ofereceu ajuda eu recusei
me achei pouco depois e sai pra rua...
"vai passar ...vai passar" ribombando em minha mente
eu não tornei a ter uma outra conversa de verdade com ela depois desta ultima no telefone...
e sei que enquanto eu viver nunca mais vou deixar de me perguntar e me culpar pelas conversas que não tivemos...pelas coisas que eu não disse...
"vai passar"
onde ela esta agora sei que realmente que finalmente passou.

Esta crônica nada mais é que a transcrição da ultima vez em que estive com minha mãe ainda com alguma lucidez no hospital.

RODRIGO CABRAL

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QUANDO NÃO DOI MAIS


  A rua estava calma!

Aquele mesmo tipo de calmaria que os soldados aprendem a reconhecer e saborear quando estão agachados em suas trincheiras a espera do próximo ataque inimigo.
 Uma leve brisa soprava na abafada tarde de verão, uma brisa fraca demais para ser refrescante e vencer o mormaço que a tudo dominava.
A moça avançada devagar pela rua, seu vestido roto de um antigo verde chamativo parecia uma vela de barco enrolada em um bambu, sua magreza era quase atroz o nariz fino e quase pontudo como um bico de ave brotava de um rosto encovado e grave, os olhos de um castanho pálido e inerte pouco luziam La do fundo de suas  orbitas, braços e pernas finos ossudos e compridos como se fossem apêndices secos presos a um tronco sem graciosidade, os seios não eram mais que minúsculos e minguados montículos em seu peito como espinhas indesejadas.
  A boca um mero rasgo horizontal naquele rosto abatido jamais conhecera os lábios de um homem. A sua volta crianças brincavam em sua balburdia infantil correndo e gritando, algumas a vendo passar soltavam piadinhas maldosas que a moça desta vez sequer ouvia.
Um grupo de rapazes a viu passar com cruel interesse como cientistas a vislumbrar uma nova espécie de inseto. A conversa entre eles cessou de imediato enquanto olhavam para ela
- La vai o espantalho – caçoou um deles em voz alta o bastante para que todos ouvissem todos inclusive ela.
Seus companheiros riram da piada, mas se a moça realmente ouviu não deu mostras disto. Continuou calada e seguiu seu caminho.
A mente dela estava longe, viajava no tempo  na única maquina temporal que realmente existe... a memória.
Ela se via pequena na escola, 10 anos a mais franzina e raquítica das crianças a ouvir insultos e ser espancada, sendo segregada. Ser pobre não amenizava o processo, sem boas roupas ou sapatos para ostentar restava ela diante de todos ver se nua de defesas e aguentar.
Aos 14 deixou a escola.
Agora pensava na mãe. Mulher medíocre de ideias e valores a mãe era um calar um resignar para tudo, não a defendera em momento algum da vida, não questionara não vivia! A mãe era sim o verdadeiro espantalho da casa. Cumprindo funções automáticas e esperando o fim.
A mãe jamais tivera lições a ensinar a moça.
Ao contrario do pai. Este sim homem tão enérgico quanto implacável tão forte quanto estúpido o pai Le ensinara uma única lição na vida, e Le bastara.
Ambos estavam na sala de casa vendo TV o pai bebia cerveja e chingava as pessoas na novela, ela a seu lado fitava a tela em mudo tédio.
Sem motivo então o pai pareceu nota La. Pegou em seu pulso com força brutal machucando-a e disse
-filha na vida as coisas não são como queremos, há dores e há decepções e a gente comete erros você esta entendendo? – ele a sacudia enquanto falava e ela espantada apenas assentiu com a cabeça.
- pois bem -  prosseguiu o pai – você nasceu de um engano e tornou-se rapidamente uma inegável decepção.
Dito isto ele voltou novamente toda a sua atenção para a TV.
O pai fora embora de casa quando ela tinha 17 anos, fugira com outra mulher. E a moça não lembrava de ter sentido falta dele.
Caminhando na rua ela na sentia as lagrimas que agora corriam sobre seu rosto, se alguém a sua volta as viu não se importou com isto. Ela seguia sozinha, mas não de todo, com ela ia sua dor.
Toda uma dor excruciante e pesada acumulada em 30 anos de existência.
Todo o medo!
Todos aqueles dias tristes de solidão e abandono, de troças das meninas de sua idade, da indiferença das moças de hoje de asco nos olhares dos rapazes quando a viam.
E da pena!
Toda aquela pena arrogante que ela via no semblante das pessoas que falavam com ela.
Tanta dor! Tanta e tão pesada dor.
Ela seguiu ate a ponte  e subiu no parapeito, La embaixo muito embaixo o rio muito raso nesta época quente e de seca corria entre suas inúmeras pedras.
A moça concedeu um ultimo olhar  as luzes da cidade La longe agora neste fim de tarde. Um ultimo vislumbre deste mundo que não a queria.
E concluiu que só havia dor e gargalhadas na vida. E que a ela coubera apenas fartas doses da primeira e nada da segunda.
Silenciosa ela pulou, caiu rumo às rochas pontiagudas.
Agora não dói mais.

RODRIGO CABRAL

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Em circulo

Eu que nunca escapei de todo do vale das sombras
Que nunca escolhi com segurança meus próprios caminhos
Escravo de pesos duradouros
Amarras que não rompem nem afrouxam
Atrelado à longa carreta das memórias e fracassos
Daqueles dias de Silvino e Otavio
Das risadas
Das fezes e urina
Episódios que ninguém esquece
Tantos olhares
Suas perseguições nas ruas
Éramos todos ferozes
Socos na ladeira perto da casa
Humilhações na barranca de terra vermelha
Tantas coisas escondidas
Meus anseios e sombras
Meus pedaços molhados de lagrimas
O ódio da menina da terceira carteira
Tanto medo sob o domínio de “J”
Sob todos os domínios muito medo
Exagero impróprio de golpes contra a garota
Amores guardados no peito jamais revelados
Vergonha patética e punhetas desde cedo
Segredos eróticos
Os seios de “R”
O corpo de uma prima
Um roçar levemente proibido
As confusões no oito de setembro
Vontade de ser melhor
Fracassos diurnos e noturnos
Thais... Perdas!
Uma chara... Revelações
Vidas perdidas no bairro
Garrafas de vinho e cheiro de maconha
E mentiras
Invejas
Como um vilão de historias em quadrinhos
Como os “mandinhos” ruminando nas ruas
Como “PD” mancando de balas
Ou besouro cambaleando de álcool
Improvável como as musicas de Afrânio
Fantasioso como as vontades nunca atendidas do órfão de pai
Minhas virtudes apagadas como a fraca beleza das duas irmãs
Poesia frágil como a saúde dos velhos
Historias nunca lidas
Desconhecidas como as virtudes da ex-mulher do velho
Nossas existências cruzando-ce nos corredores das fabricas
E nas ruas do bairro brigas e roubos
Historias... todas mais aterradoras que os contos de Poe
Mais reais
Jogos as quintas à tarde aos sábados e domingos
Sinuca a qualquer hora
Habitantes dos bares
Velhos bêbados
Mulheres vadias
Viciados e traficantes
Todos os acontecimentos concentrados em volta das mesas
Desafetos e cobiças
Espancamentos e vinganças
Juras, facões cortes e rasgos.
Sangue impuro contaminando a terra
Jovens demais cavalgando a fumaça
Perdidos e inúteis
Perto do limbo
E sob as montanhas
Às vezes corpos e pés da planta proibida
Enfastiados e enegrecidos de manchas
Ilegais trazendo nas costas o produto de suas caçadas noturnas
Safares urbanos na África das residências descuidadas
Musicas medíocres e suas canções sujas
Melodias poluídas
O melodrama dos que se perderam
“K” e os outros como satélites elevando-se sobre a imundície dos sem futuro
Caixas de cerveja e CDs piratas
Trouxinhas de pó e festas improvisadas
Cemitérios ao cair da tarde
Fotos sob a débil luz da aurora
Livros e imagens místicas
Conversas antediluvianas sobre os antigos senhores
Aspirantes a bruxos modernos
Algumas lâminas
Velhos manuscritos
Boatos de desova da carne e animalismos
Mães desnaturadas
Bebes mal cuidados
Noites longas e boemias regadas a cervejas e vomito
Longas noites aquelas
Longos dias
E tudo segue.





                                      Para "R.D" que sempre soube que um dia eu contaria estas historias.

RODRIGO CABRAL

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TODO O TEMPO

Ainda ontem eu pensava neles e relembrava o passado
O tempo e algo engraçado
Só um livro grande de historias antigas e inéditas
Só uma viagem
Ainda ontem eu lembrava de outrora
Já faz tanto tempo assim?
Desde que passei os dias as margens de um rio
Que era lento?
E tardes com livros a beira do mar
Aqueles dias ainda estão vivos e voltam às vezes
Como se fossem alguma crise insone
A bem da verdade tudo volta
O carrossel da vida não pode parar
E diverte-se em lançar Le coisas na cara
Alguma coisa amarga
Talvez um vicio antigo
Ou um temido segredo
Eu tenho muitos
E será que já faz tanto tempo assim?
Desde quando isto importa?
Desde quando eu me permito à saudade?
E fácil visitar o passado
Só que machuca às vezes
Eu revejo minha briga no campo
Minhas tramoias na infância
Quando tudo era questão de manter-se longe
Algumas noites a espreita nas esquinas
Achando as coisas perfeitas
Tudo volta agora
Parecendo balas que ricocheteiam
Tanto medo e tanta covardia
Um patético garoto tentando se enquadrar
E chorando a noite na penumbra do quarto
Você pode entender do que estou falando?
Eu falo de heróis e mitos
Eu falo de medos
E dores corajosas
Eu falo de meninas e inimigos
Eu falo de apostas e segredos
Falo de descobertas
Falo de vida
Não da para saber ate aonde vai
Ou como e que tudo funciona
Talvez eu tenha uma função neste mundo
Quem sabe as coisas não se resumam a um propósito
Alguma ideia cretina que virou o enredo da minha vida
Meu próprio talk chow de perguntas sem respostas
Afinal ainda ontem eu estava em paz
Estava melhor
E agora... agora o passado vem me contar que não esta morto
Só quieto e a espera
Como eu ele não tem pressa
Não há como fugir disso
Mas quanto tempo faz?
Há quanto tempo deixei que amigos preciosos se fossem?
Para onde terão ido?
Há quanto tempo fechei os olhos para as injustiças e me aliciei a elas?
Será que estou realmente arrependido?
Será que isto e poesia?
Prefiro não pensar demais no assunto
Deixar velhos fantasmas no limbo escuro do tempo
Fechar os olhos e sentir a brisa
Ouvir os murmúrios do mundo
Que continua ai, contando historias e expondo pessoas.
E o que somos no final
Apenas alvos pra se abater a tiros
Apenas manchas na pele do corpo maior
Só assim pra nos sentirmos uteis
Nos iludirmos que fazemos parte de algo maior
Que no final há uma recompensa
Quanto tempo se passou desde que parei com isto?
Acho que mais do que e conveniente lembrar
Quantas perguntas ainda ficarão sem respostas?
Quando e que o tempo acaba e a gente desaparece?
Vamos a algum lugar depois?
Um vale de ramos silvestres e animais dóceis
Uma terra de rios cristalinos e frutas prodigiosas
Uma mata generosa
E chegaremos La cansados e confusos
Não mais do que estivemos a vida toda
Sorridentes iremos desfrutar as delicias desta terra
Ate tomarmos ciência de que nosso tempo acabou
Por isso estamos ali
E quando foi isso?
Que erro teremos cometido?
Há quanto tempo aconteceu?
Mas já não há volta
Não há saída do mar de rosas
Só uma historia nos será contada
Por um ancião de longas barbas
Ele nos dirá que a morte veio de braços abertos e nos
A abraçamos
Trocamos com ela um beijo
E dirá não se assustem nem recriminem
Eu sabia que iria ser assim
Todo o tempo.

RODRIGO CABRAL

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BERNADETE

Da série:
TANTAS VOZES NA CIDADE.

BERNADETE

Bernadete é diarista,acordou cedo caminhou,pegou ônibus,pegou metrô,caminhou mais,chegou no trabalho.
Fez café,fez almoço,limpou,lavou,organizou,ouviu,e aturou.
Bernadete voltou
Caminhou,pegou metrô,pegou ônibus,caminhou mais,chegou em casa.
Fez jantar,lavou a roupa,arrumou a casa,ajudou os filhos,ouviu os filhos,ajudou o marido,aturou o marido...
Tudo ia como sempre pra Bernadete...
Ate pedir pro marido por o lixo pra fora...
-Vá você Bernadete eu trabalhei o dia todo to cansado.
Nem uma palavra...Bernadete foi...
Pegou o lixo saiu pela porta passou pelo quintal,passou pela lixeira passou pela rua e foi...foi...foi
Bernadete nunca mais voltou.

RODRIGO CABRAL

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CONJUGOU SAUDADES

Aprendeu a conjugar saudade...
Em dias longos sob as sombras das horas
Aprendeu a esperar sem medo...
Sem outra escolha sem outras histórias
Aprendeu a entender as escolhas
A aceitar...
Aprendeu a duvidar do sonho
a duvidar do tempo
Aprendeu a sussurrar no escuro
segredos velhos
vergonhas mortas...
Aprendeu a conjugar saudades
Criou seu verbo...
Seguiu adiante...
Partiu.
RODRIGO CABRAL
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ALTURAS

Eu já não explico as vozes
Não... não mais...não as vozes
A muralha que transpus abateu meu espirito
Esfacelou o ego...
Sem chamas... sem auges...
Não vi vitória aqui
Eu já não persigo o sonho
O onírico morreu esta noite
Agonizou no fim...
Em estertores brutos
Eu vi...
Assisti paciente
Eu já não faço mais parte daquela historia
Nem da tua...
Nem da dela...
Nem de qualquer outra...
Sou conto inacabado
Tropecei num fim prematuro
Um clímax inesperado quando a noite ainda era jovem
Não verei novos dias
Não viverei novas sagas
Se é que as vivi alguma vez...
Eu já não reconheço o tempo
As horas são promessas vazias
Lembranças confusas...
Qual sua importância?
Para que serviam?
Para que serviram?
Para que servem?
A quem servem?
Eu já não leio Ginsberg
A poesia não me inunda
Tem algo morto em mim
Algo que se decompõe
Que me invade...
E machuca...
E o amanhecer esta tão longe ainda...
Tao, tão longe...
Eu já não admiro a vista
O topo e tão árido...
O topo e tão frio
O sucesso é tão solitário
Os motivos parecem tão tolos
Tola é a vontade que me move
Tolo é o medo que me detém
Tolo e o desejo que persiste
Tola a flor
Tolo sou eu
Eu já não explico mais as vozes...
Abafo a consciência teimosa
Eu calo
Estou no topo lutei pelo topo
Conquistei o topo...
E só quero voltar ao chão.

RODRIGO CABRAL

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ALCATEIA

A floresta é sombria
Na relva úmida apodrecem as folhas do outono
O vento nas copas das arvores
O medo cercando os caminhos
Eles estão nas trilhas
Nas sombras
Nas ramagens
Hoje ronda a alcateia
Lobos famintos na noite
Eles podem sentir...
Conhecem teu medo.

RODRIGO CABRAL

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A NOITE É TUA...

A noite é tua...
Sou todos garrafas e copos...
Todo vinhos e uísques...
Apenas ébrio
A noite é tua...
Nenhum conselho para você
Nenhuma historia minha esta noite
Sem poemas...
Os poemas escorregaram pela borda do copo
E jazem afogados no álcool
A noite é tua...
Nenhuma memória retorna
Nem mesmo um fugidio lampejo de antigo saber
Nada...
Natureza vazia de alma
Igreja sem Deus...
Solidão...
A noite é tua...
Nenhuma força aqui comigo
Nem mesmo ódio
O ódio acabou...
A paixão desvaneceu
Não há lugar pra vinganças
Sem medo nestas trevas
Só luzes insuficientes
Sorrisos mundanos
E vozes...
A noite é tua...
Sem argumentos
Sem desculpas
Não há duvidas...
Só aceitação...
Apenas conhecimento...
Descoberta infeliz...
Tantos cosmos me cercam no bar
Pessoas em galáxias de angustia  etílicas
Curtindo magoas e miséria
Ou apenas inconsequência?
Não importa
A noite é tua...
E eu sou teu...
Brindo a você
Tristeza.

RODRIGO CABRAL

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Rótulos

Triste pra mim é que o feminismo exista,triste pra mim é que o movimento LGBT exista,triste pra mim é que o machismo exista,triste pra mim é que o movimento negro exista,triste pra mim é que a esquerda exista,triste pra mim é que o racismo exista,triste pra mim é que a direita exista.Perdemos a capacidade de entender ideias e de respeitar as pessoas pelo que elas são...perdemos o rumo quando tudo que existe passou a ter um rotulo ,um nome,a pertencer a um movimento a um contexto...
Quando vejo alguém com fome...só vejo alguém com fome...quero alimentar a pessoa...não existe fome de direita ou de esquerda,não existe fome machista ou feminista...só existe fome...
DESCULPE SÓ USO RÓTULOS EM REMÉDIOS... PESSOAS EU CHAMO PELOS NOMES.

RODRIGO CABRAL

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Black stone

O encontramos numa noite vazia
Liquido e confuso girando no copo
Black Stone Lhe entregamos nossas memórias
A semente da loucura germinando problemas
Uma colheita de frutos amargos
Vem que vamos cavalga lo
Black Stone pedra negra
Traga pra nos a sua dádiva
Esquecimento
Por que o dia aqui e longo demais
E a dor!
Quem pode suportar toda esta dor?
Perdidos na bruma desta cidade triste
Black Stone nos fará companhia
Você pode falar de verdades com ele
Pedra negra te carregando na nova viagem
Levando-nos três pelo vale da melancolia
Talvez mais do que nunca só precisássemos de força
Talvez apenas de uma fuga
O que e certo e que naquela noite queríamos falar com Deus
Pra reclamar com ele sobre nossas velhas historias
E deus nos ouviu sob a voz de Black Stone
Pedra negra nos guiando pela estrada celeste
De que outra forma o senhor nos ouviria?
Doze após doze numa comunhão anunciada
Já é tempo de ficarmos a deriva
Carregue-nos contigo pedra negra
Jê e tempo de sorrirmos pro escuro sem volta
Na nossa hora
A hora do gargalhar insano ausente de motivos
Sei que pode entender-nos Black Stone
Isso é só um meio de escapar da força implacável da consciência
Por que o amor e só outra forma de sentir dor
E a vida não traz oportunidade alguma
Ela tosa impiedosa as asas de nossa poesia
Por que há um filho que sofre numa gestação difícil no ventre
Um filho pesarosamente imperfeito
E hoje só temos você Black Stone
Pra podermos chorar
Fingindo o efeito do álcool
Pra ficarmos excitados
Fingindo ignorar os problemas
Pedra negra te celebramos na noite do copo
Um brinde qualquer as dores da Terra
Pedra negra passando de Mão em mão
De boca a boca
Pegando para si em cada um uma historia
Pedra negra esvaziando no passar das horas
Nossos corações oprimidos
E nossos cérebros enlouquecidos
Black Stone ri pra nos do fundo da garrafa
Ele sabe de tudo
Tudo o que sabe e inútil
A pedra negra e paciente e aguarda
Black Stone nos mantém alto
Pra pensarmos que estamos felizes
Mas não há felicidade aqui e ele sabe disso
Black Stone você nos mantém sob efeito
Sob efeito.

RODRIGO CABRAL

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ALMA EM TONS NEGROS

Não basta que seja sombra
É a escuridão completa que busco
Quero o negrume sem céu e sem saída
Quero matizes acinzentados e intumescidos
Busco mergulhar nas trevas densas
Tão frias e indiferentes que sugam
Quero um lago profundo de não existência
Um lugar de medo e de vazio
Quero uma cor voltando ao fosso
Voltando ao negro
Quero o esmaecer sem vida da beleza
Regojiso-me no conforto sem tons brilhantes
Na desesperança que e escura e mórbida
Busco a cor dos túmulos e dos esquifes
Quero pra mim a terra sobre as covas
Busco lapides
Estou atrás do negro que volta ao negro sem nunca deixar de se-lo
Quero mais do que os mais lúgubres e carmim dos tons
Quero um dia cinzento e apagado
Quero um Ser magoado de escuros
Pesares e lamentos
Hoje busco não a força, mas a fraqueza de caráter.
A maldição interessa mais que a redenção
Quero navegar no mar ocre que não tem perdão
Quero vagar pela noite densa de lamentos
Quero aquela treva que se estende e grita
Pontilhada salpicada de lagrimas
Quero o repouso sem cor e sem luz
Sem alma
O condenado preso de tormentos
Quero a pupila escura... negra no olhar que não tem esperança
Nem causas
O terror do soldado no combate
A cor do fundo das trincheiras
Das fossas
Das cavernas e buracos
Onde habitam apenas sentimentos sujos e maldosos
Quero entender de onde vem
Pra onde vai?
De que e feito o pestilento éter do planeta
Hoje teu planeta
Quero mergulhar nas mais negras águas existentes
Quero conhecer a alma
A alma humana
A tua.



                          Para Jonnas que não sabe...mas não esta alem da ajuda ainda!

RODRIGO  CABRAL

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AINDA OS CHAMADOS

Há algo errado com a poesia do mundo
Vejo lacunas e vácuos
Sinto grandes espaços abertos
Vazios
Poderosas vozes não soam faz tempo
Sua falta ecoa nos livros
Ressoa nas bibliotecas
Espalha-se pelo mundo
Quem calou você Drumonnd?
Que maldito destino fechou tua boca de poeta?
Não mais uma pedra no caminho
Pra onde foi tua louca irreverência poética Ginsberg?
Você agora recita para os anjos?
Lança olhares libidinosos para os santos?
Apenas sumiu...
Quem conta tuas coisas agora Dylan Thomas?
Quem lamenta chora e se despedaça de amor como você?
Rimbaud não o faz
Rimbaud também se foi
Por onde anda você Ferlinghetti?
Foi publicar maluquices revolucionarias em outra dimensão?
Talvez apenas esteja estupefado
E levou Corso com você eu percebo
Nada mais dele por aqui
Só rastros
Velhos e poeirentos
Quem obstruiu teus avanços Quintana?
Sem xícaras ou rimas para você
Nunca mais na verdade
Te foste velho
E mais velha ainda fenece tua poesia
De Burrows e Bukowski só restam os nomes
E duvidosas reputações
Quem comeu seus orgulhos meus caros?
Que geração é esta que quase os esqueceu?
É como esquecer da dor
É como não lembrar de ter medo
A que arcaicas e monótonas funções sociais serve a poesia de vocês hoje?
Campanha antidrogas? Antifumo? Anti álcool?
Anti o que mais?
Ou pró oque?
Hoje tudo se resume a isto
Quem é Neruda?
Ele sabe cantar?
Tem um site? Um blog?
Quem o conhece?
A morte os levou todos vocês?
Será mesmo?
Por que ela faria isto?
Acho que não importa
A memória e a obra ficam
Mas parecem tão desgastadas
Tão etéreas
Tão tacanhas agora
Blake já não fala
Baudelaire emudeceu
Do porão Solomon já não grita
Sem Walt Whitman
Sem Garcia Lorca
Sem Fernando Pessoa
Artaud não vem mais
Ninguém mais vem
Tudo acabado
No pó e no silencio
Permanece ou permanecera só a obra
A obra ainda respira e agoniza
Assombra os portais das novas gerações
Às vezes afetam alguém
Outras tantas só um arrepio passageiro
Velhos deuses pairando no limite do esquecimento
Mundo novo rapazes
Novos tempos
Outras ideias
Mas sei onde encontra-los 
Ainda conheço o caminho de suas casas
Ainda nos veremos
Da bagunça da minha estante ouço bem fortes os seus chamados.

RODRIGO CABRAL

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A LUA QUER OUVIR

Eu conheço a distancia que persegue teus passos
Eu já senti esta fome mundana que te enche o peito
Eu já fugi das mesmas coisas
Já vi Bukowski discorrer sobre loucura e sujeira
Sobre ruas e mendigos
Sobre bêbados e putas
E com que talento ele fez isto!
Posso sentir teu medo enjaulado em você
Um animal faminto e furioso urrando pro nada da tua vida
O medo é só isto!
Ainda que ande em matilhas como velhos lobos perversos de antigas fabulas
Ainda que alimentado e aumentado por tua ignorância...
O medo é só o medo!
Você e eu contadores de estórias que ninguém quer ouvir
Tantos bares e praças
E calçadas você lembra?
Velhas casas abandonadas com cheiro de mato e mofo nas paredes
Risadas insanas e vinho
Nada é mais selvagem!
Nos vimos Ginsberg uivar e uivamos com ele
Soubemos de Solomon em coma e mergulhamos no mesmo torpor
Eu soube de Corso... mas você não!
Admiramos Dylan Thomas pelo que ele escrevia
Mas entendíamos também o fascínio de suas garrafas
Eu conheci Neal Cassady e Jack Kerouac em dias em que estavas perdido
Não trocamos correspondência
Definhou a nossa poesia
Velho amigo eu sei da liberdade que você precisa
Eu conheço o vicio de que não podes fugir
E acredite por mais que tentes... não consegues esconder de ninguém o teu medo!
Velho amigo quando o passado e mais que lembrança o futuro tende a ser triste
Quando você só pode falar da dor...
Falar com a dor...
Pedir a dor...
Lutar com a dor...
Lutar pela dor...
O presente tende a ser sombrio
Se hoje ainda andas em terras estranhas não mais te preocupes
Não é solo em que pisas velho amigo!
É sim o cuidado com onde você Poe o pé
E se a via Láctea não te espanta mais
Se obscuro e o sinistro não podem mais Lhe tirar o sono
Então espie esta noite que chega
Há uma lua La fora... sempre houve
Deixe os medos e a poesia pra amanhã
Toque seu violão, a lua quer ouvi-lo hoje.

RODRIGO CABRAL

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A CIDADELA TOMBOU

A cidadela tombou
Com estrépito e horror seus muros caíram
Não vi reis nas fileiras dos que a defendiam
Não vi nobres gritando entre os soldados
Embora tenha visto muitos soldados mostrando-se nobres
A cidadela tombou
Caiu o ultimo bastião ao romper da aurora
Em fogo e sangue lavada a muralha
Coragem e covardia lado a lado na turba
Crianças fugindo...
Vi crianças gritando...
Vi crianças escondendo-se...
Oh céus vi crianças morrendo...
A cidadela tombou
Foi-se por terra a ultima resistência da torre
Pereceu violentamente o ultimo defensor dos portões
Morreu em silencio...
Sem gritos ou xingamentos
Sem maldiçoes ou suplicas
Tombou feito guerreiro
Calado  e lutando
No fim a morte nunca quer alarde
Não importa quanta dor nem quantos gritos
No fim... A morte e silenciosa
A cidadela tombou
Morreu hoje no ocidente a ultima dinastia real
A derradeira realeza se foi gritando ordens covardes de sua sala
O trono não os protegeu
O dinheiro não parou o inimigo
Os títulos não os impressionaram
A realeza se foi ignorante e sórdida
Urrando ordens a pobres defensores desesperados
No fim só eles...
Apenas eles...
Os soldados valeram de alguma coisa entre todas as posses do rei
Mas...
A cidadela tombou
O fogo já devora a ultima sala dos nobres
Os saqueadores já espoliam ate a ultima moeda do tesouro
O castelo não é mais castelo... é ruína
A cidadela tombou
É o fim do ultimo reino
Novos poderes proclamam suas posses nas ruas
Novos senhores exibem aos derrotados sua força
O povo assiste...
Apenas assiste...
O povo sempre soube como isto terminaria
O povo viu este reino nascer
Viu tantos outros...
Paciente e resignado o povo apenas espera
Pois reis nascem e morrem
Governos vão e vem
Mas só o povo permanece.

RODRIGO CABRAL

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CPP