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Novos Contos de Natal da Matilde -12

 

Coração de Criança

 

 

Muito bem, menina Matilde, agora que já decidiste qual a prenda que vais dar à Bela, é bom que também te decidas quanto à tua.

Matilde já adivinhava que o avô não ia perder aquela oportunidade, pois há já vários dias que vem dizendo que o prazo para o Pai Natal receber as cartas, estava encerrado. O problema é que ela é uma criança que nunca quer brinquedo, seja pelo aniversário, pelo Natal ou por outra data qualquer. Sempre que alguém lhe pergunta o que quer de prenda, responde que só quer roupa.

Esta postura de desinteresse por brinquedos, não só preocupa a mãe, como também toda a restante família, avô incluído, assim como os amigos mais chegados, não por temerem que possa ser uma criança infeliz, antes pelo contrário, sempre de sorriso fácil e, pelo menos aparentemente, feliz, mas sim pela dificuldade que isso provoca na escolha de prendas para lhe darem.

Quando ela era mais pequena, ainda foram acreditando que aquilo passaria, mas os anos foram passando sem que a atitude da menina se alterasse. perguntem-lhe o que deseja como prenda e a resposta vem logo de imediato, roupa, pelo que a resposta da neta, o apanha completamente de surpresa:

- Muito bem, avô, quero coisas para a escola.

O avô, sem conseguir esconder todo o seu espanto, tenta encontrar uma saída para tão delicado momento, onde é que já se vira uma criança, em vez de pedir brinquedos pelo Natal, pedir coisas para a escola, se até conseguia perceber a sua preferência por roupa, agora por esta é que não esperava mesmo nada.

- Só isso?

- Não. Também quero uma boneca.

- Uma boneca! Ouvi mesmo bem, Matilde, tu queres uma boneca?

- Sim, mas não precisa ser uma boneca cara. Ah, e se puder ser, também gostava de receber aqueles sapatos que estive a ver lá naquela sapataria ao pé da casa da madrinha. Ainda te lembras quais eram Bela?

- Sim. É claro que lembro.

Matilde, ao ver a cara de espanto, principalmente do avô, apresta-se a esclarecer:

- Escusas de estar com essa cara. Eu não mudei de ideias. O que se passa é que nos anos anteriores, a minha mãe não tinha trabalho, pelo que o dinheiro fazia falta para outras coisas. Se eu te pedisse brinquedos, era a minha mãe quem tinha de arranjar dinheiro para me comprar as roupas e as coisas da escola, assim, se vocês me dessem isso, já ela não precisava de se preocupar tanto.

- Está bem, meu anjo. E quanto aos sapatos? Tu nunca pediste calçado.

- Pois não, eu fazia os possíveis para não estragar aqueles que tinha, como só posso calçar um par de cada vez, para que ia querer muitos?

- Então e agora?

- Agora! Agora apetece-me ter outro par de sapatos.

Nessa noite, ao passar pelo quarto da neta, o avô ouviu-a a falar sozinha, entreabriu a porta de modo a não se fazer ouvir e ficou espantado com o que ouviu:

 

“Obrigado meu Deus, por teres arranjado trabalho para a minha mãe, assim já me posso dar ao luxo de lhe pedir mais um par de sapatos.”

 

O avô, tal como entreabrira a porta do quarto da neta, voltou a fechá-la, pensando para consigo: “Como o mundo seria muito melhor se os adultos se deixassem de avarezas e seguissem os exemplos que um coração de criança nos pode mostrar, principalmente nestes momentos em que as tentações espreitam em qualquer montra de Natal.”

 

Francis D’Homem Martinho

 

12/12/2019

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Beber do Natal

Beber do Natal

Porquê palavras complicadas?
Porquê frases tão elaboradas?
Afinal são os pequenos nadas
Que deixam as almas confortadas.

Porquê coisas de elevado valor?
Porquê gastos de tanto suor?
Afinal são simples gestos de amor
As prendas que nos sabem melhor.

Jesus Cristo não queria riqueza,
Denunciou hipocrisia e cinismo,
Sua luta era contra a pobreza.

Vivemos esta quadra especial,
Mesmo que de puro simbolismo,
Saibamos beber o espírito de Natal.

Francis Raposo Ferreira
12/12/2019

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O Passado Numa Nuvem de Fumo

O Passado numa nuvem de fumo

 

Expulso, em cada nuvem de fumo,

Um pouco do meu passado,

Recordando como o meu rumo

Foi, por teu desejo, modificado.

 

Em cada passa deste cigarro,

Inalo algumas recordações,

Restos da vida, a que me agarro,

Onde nem tudo foram desilusões.

 

Tu, apareceste no meu caminho

Para me alterar toda a vida.

Também tu, vagueavas sozinho.

 

Quando te sentiste apoiado,

Deixaste-me a mim perdida.

Beata daquele cigarro queimado.

 

Francis Raposo Ferreira

11/12/2019

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Novos Contos de Natal da Matilde 2019 – 11

 

Sagacidade de Criança

 

Matilde, já esquecida do sonho que a fez andar às voltas com o mágico livro do dinheiro, mas sem conseguir explicar a existência da nota de 20 euros, resolve aproveitar o dia de quarta-feira para pedir ao avô que lhe dê algumas ideias sobre que prenda poderá oferecer a Bela, a avó nova.

- Olha, podes, sempre, oferecer-lhe um livro. Sabes como é, estando no mundo dos livros, está no mundo dela.

- Oh avô, não achas que já tivemos livros que cheguem para este Natal todo? Para este e para muitos mais. Não sei.

- Pois, mas se não fosse a história do livro do dinheiro, não tinhas arranjado 20 euros.

- Avô, achas que pode ter sido a Bela a colocar lá a nota?

- Lá onde?

- Ora, e eu é que sei. No meu sonho, fui eu que a pus debaixo da almofada, mas como nesse mesmo sonho também havia um livro que nem sequer existe.

O avô, tentando colocar um ponto final no assunto, disse-lhe:

- Matilde, vou contar-te um segredo, mas tens de prometer uma coisa, não contas nada à Bela. Prometes?

- Sim.

- Fui eu que pus a nota debaixo da tua almofada, ontem à noite, como a Bela já te disse, não consegui dormir nada de jeito, então resolvi ir até ao teu quarto, vi-te a dormir tão tranquila que aproveitei e pus a nota debaixo da almofada.

 Matilde dá um beijo na face do avô:

- Eu sabia, só podias ter sido tu ou a Bela, mas sempre acreditei mais que tivesses sido tu.

O avô, vendo como a neta parece acalmar alguma da ansiedade que andava a apoquentá-la, felicita-se a si mesmo pela ideia, só não contando com o imprevisto que se segue:

- Matilde, quero dizer-te uma coisa, pois não acho justo deixar-te andar a pensar quem é que poderá ter colocado a nota de 20 euros debaixo da tua almofada, além de não ser justo para o avô, pois quem lá pôs a nota, fui eu.

Agora sim é que está instalada a dúvida total, pois se o avô acaba de dizer que foi ele, como é que pode ter sido Bela?

A menina olha para o avô, depois para Bela, coça o queixo, volta a olhar um e outro:

- Bem, vamos fazer assim, para nenhum de vós ficar chateado, admitimos que cada um deu 10 euros e pronto.

Avô e Bela concordam com a ideia da pequenita, mas não conseguem evitar um cruzar um olhar que quer dizer, muito pura e simplesmente: “Eu sei que não foste tu”.

Matilde, demonstrando toda a sua sagacidade de criança, diz:

- Bela, tens algum livro que andes a pensar em comprar?

- Matilde, ainda agora acabaste de saber de onde vieram os 20 euros e já estás a pensar como os gastar?

- Não faz mal, o dinheiro serve para isso mesmo, para podermos ser felizes fazendo a felicidade daqueles de quem gostamos. Já sabes, a tua prenda de Natal, vai ser um livro. Ah, mas não é o “Livro do Dinheiro.”

 

Francis D’Homem Martinho

11/12/2019

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Novos Contos de Natal da Matilde 2019 – 08

 

Surpresa

 

 

O avô Martinho, sem dar qualquer sinal disso, ia estudando o comportamento da neta, ao mesmo tempo que ia inventando pequenas histórias de Natal que também pudessem ser verdadeiras lições para a vida:

- Avô, quero confessar-te uma coisa.

- Sério, netinha do meu coração?!Já te disse que és a minha neta preferida?

- Não. Ah, mas também não precisas, eu sou a tua única neta.

- Pois é verdade, já me esquecia. Afinal, o que queres confessar-me?

- Eu tenho andado a tentar acertar com a folha certa do teu livro, e acho que hoje, ao fazer como ontem me ensinaste, estive quase, quase, a abrir o livro logo na folha certa. Vou ter de esperar mais alguns dias até poder comprar as prendas de Natal.

- Acho que ao procederes assim, com lealdade e paciência, estás muito próxima de o conseguir. Como te contei, trata-se de um livro mágico, pelo que consegue saber qual o comportamento das pessoas.

- Avô, eu tenho andado a enganar-te, se calhar é por isso que ainda não consegui acertar com a folha certa, quando eu te dizia que estava com sono e me queria ir deitar, isso não era bem verdade, pois o que eu queria era que a noite passasse depressa para vir a correr abrir o livro. Algumas noites, porque pensava que eras tu que ias pôr o dinheiro no livro, esperei que tu e a Bela se deitassem e depois vim em bicos dos pés, ver o livro.

- Sabes uma coisa, minha marota, acho que ao revelares essas tuas pequenas fraquezas, te estás a aproximar de um verdadeiro milagre de Natal. Mas não penses que me enganas, eu bem tenho visto os teus olhinhos de sono, quando não adormeces mesmo no meu colo, ou vais-me dizer que também estavas a fingir nessas alturas.

- Não. A verdade é que eu talvez até tivesse algum sono, só não teria era assim tanto.

-Bem, isso agora pouco importa, pois o mais importante é teres revelado toda a verdade.

Bela, a avó nova, apesar de concentrada na sua leitura, não deixava de admirar como o avô Martinho conseguia dar a volta ao texto e fazer com que a neta, sem se aperceber disso, fosse interiorizando os verdadeiros valores de uma vida de verdade e lealdade para com todos, principalmente consigo mesma.

- Avô, achas mesmo que ainda vou a tempo de conseguir um milagre de Natal?

- Creio que sim. Pelo que sei do livro do dinheiro, ele costuma ser muito benevolente para com quem confessa os seus comportamentos menos certos. Agora tens é de saber esperar, pois não acredito que o livro te vá dar essa felicidade assim tão depressa, mas como estamos na quadra de Natal, tudo é possível.

No dia seguinte, Matilde, ao contrário do que vinha fazendo, esperou que o avô e Bela se levantassem, só depois descendo:

- Avô, já abriste o livro, hoje?

- Não. Nem me lembrei disso.

A pequenita correu em direcção à estante onde estava o livro mágico, agarrou-o, olhou bem na frente das folhas, depois olhou-as por cima e, por último, por baixo, mas não lhe pareceu ver nada de diferente em nenhuma delas, pelo que decidiu abrir numa qualquer:

- Que foi isso Matilde?

- Isso o quê, avô?

- Pareceu-me ouvir papel a amarrotar-se. Devem ser coisas da minha cabeça.

- Não. Acho que também senti a nota a desaparecer. Sabes que acho que foi por muito pouco.

No dia seguinte, tudo se repetiu até a menina pegar no livro, olhá-lo de frente e parecer-lhe ver uma abertura ligeiramente maior entre duas das folhas. Abriu o livro e soltou um grito de alegria:

- Avô! Bela! Consegui. Consegui 20 euros.

Bela olhou para o avô Martinho e sorriu-lhe, como que a dizer-lhe: “Muito bem”.

Matilde nem queria acreditar, a história do livro dar mesmo dinheiro, não era nenhuma invenção do avô. Só que este também não compreendia o que se passava, pois não fora ele que lá pusera a nota. Olhou para Bela e esta fez-lhe sinal que jurava não ter sido ela.

Não era só Matilde que se sentia incrédula com o que acabava de suceder. Bela tinha a certeza que só podia ser obra do avô Martinho, mas este também tinha a certeza que só podia ter sido ela.

 

Francis D’Homem Martinho

08/12/2019

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Esta Noite

Esta noite

 

Esta noite soube-me bem,

Não por mim, por ti.

Esta noite vi mais além,

Não em ti, em mim.

 

Esta noite fui tão louco,

Não por ti, por nós,

Esta noite foi tão pouco,

O som da nossa voz.

 

Esta noite deixei-me ir,

Não em mim, em ti,

Sem precisar de fingir.

 

Esta noite deixaste-te levar,

Não em mim, mas sim

No silêncio do verbo amar.

 

Francis Raposo Ferreira

08/12/2019

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Equilibrio de Sonhos

Equilíbrio de Sonhos

Vou equilibrando meus sonhos
Numa espécie de corda bamba,
Momentos terríveis, medonhos,
Mistura de marchas e samba.

Vislumbro seres mitológicos,
Elefantes com asas de borboleta,
Raros achados arqueológicos.
Sonhos, loucuras, de um poeta.

Circo de feras amestradas,
Que vagueiam por entre cadeiras,
Onde estão musas sentadas.

Meninos ranhosos, risonhos,
Entretidos em suas brincadeiras.
É este o Equilíbrio de sonhos.

Francis Raposo Ferreira
08/102/2019

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Novos Contos da Matilde 2019 – 07 - Lição

Novos Contos da Matilde 2019 – 07

 

Lição

 

 

O avô Martinho já andava a estranhar o comportamento da neta, mas resolveu não lhe dizer nada, pois tinha, quase, a certeza que o mesmo estava directamente relacionado com o livro do dinheiro, visto Matilde nunca mais ter tocado no assunto. Os dias foram passando e, tal como o avô previra, uma noite, a pequenita não se conseguiu conter por mais tempo e perguntou-lhe:

- Avô, tens a certeza que aquela história do livro dar uma nota por dia, é mesmo verdade? Parece-me ser um livro perfeitamente normal.

- Claro que tenho. Já por mais de uma vez, consegui acertar com a página e tirar de lá algumas notas, olha que uma até era de 50 euros.

- Oh, só a mim é que não me sai a página certa.

Matilde deixara-se trair pela conversa do avô e acaba de confessar aquilo que ele já sabia, ela andava a experimentar o livro, mas fingiu não ter percebido nada, optando por lhe dizer:

- Anda cá, senta-te aqui na minha perna como tanto gostas de fazer quando queres que te conte uma das minhas histórias.

O avô aguardou que a neta se aninhasse no seu colo, afagou-lhe os cabelos, fez-lhe uma festa no rosto e disse-lhe, naquele seu jeito tranquilo e doce de contar histórias:

- Sabes, o livro, por ser mágico, é como a nossa vida, também ela todo um enredo de histórias, umas de encantar, outras não tão felizes, mas é assim mesmo a história da vida.

- Oh avô, agora é que não estou a perceber nada do que estás para aí a dizer.

- É fácil. Na nossa vida, quando estamos perante uma qualquer aflição e queremos resolver o problema, só temos duas possibilidades, ou paramos para pensar e procuramos uma solução com toda a calma, ou tentamos resolver tudo à pressa. O que acontece, é que quando queremos fazer tudo à pressa, parece que não só não conseguimos encontrar a solução, como ainda fazemos acentuar o problema, enquanto que quando paramos para pensar, tudo nos parece muito mais fácil.

- Está bem, avô. Agora diz-me o que é que isso tem a ver com o livro.

- Volta a ser muito fácil.

- Pois, para ti é tudo muito fácil.

- Tenta acompanhar o meu pensamento. Assim como quando paramos para tentar encontrar a solução do problema, também se não nos precipitarmos a abrir o livro sem pensar primeiro e olharmos com atenção, talvez consigamos encontrar algumas pistas que nos possam ajudar.

- Como assim, avô?

- Pensa bem. Se houver uma nota entre duas folhas do livro, não é normal haver uma certa abertura entre as mesmas?

- Tens razão, avô. Tenho sido tão apressada, que nem sequer tenho reparado nesse pormenor. Sabes uma coisa, vou-me deitar.

O avô, uma vez mais, interpreta, na perfeição a ansiedade da neta, quer ir dormir na esperança que o tempo passe mais depressa e logo, logo, seja manhã para poder testar a teoria dele.

Matilde dá dois beijos ao avô, outros dois a Bela, a avó nova, e lá vai rumo ao quarto, nem reparando como o avô sorri, feliz por ter conseguido passar mais uma importante lição de vida à sua pequenita.

 

Francis D’Homem Martinho

 

07/12/2019

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Rei da Fantasia

Rei da Fantasia

 

Hoje libertei-me de amarras,

Dei asas à imaginação,

Tu, tristeza, não me agarras,

Não me prenderás à solidão.

 

Quebrei todas as correntes,

Prendi-me de ideias só minhas,

Fui por caminhos diferentes,

Serpenteei entre reis e rainhas.

 

Ocupei aquele desejado trono,

Fui dono do velho mundo

Que vai vegetando sem dono.

 

Espalhei toda a minha alegria,

Ri-me deste reino imundo.

Hoje, fui o rei da Fantasia.

 

Francis Raposo Ferreira

07/12/2019

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Sou Assim

Sou assim

Franco; vaidoso;
Bruto; sincero;
Meigo; forte; leal
Simples; guloso;
Sou amante que espera
Respeito no meu ideal.
Respiro a liberdade
Da chuva e do vento,
Amo a sinceridade,
A todo o momento.
Abomino hipocrisias,
Solto gargalhadas
Se me dão alegrias,
Sorrio de pequenos nadas.
Sem me deixar pisar
Eis-me aqui,
Não vou mudar.
Amo e…sou assim.

Francis Raposo Ferreira
07/12/2019

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A Força da Tua Braçada

A força da tua braçada

 

A força do teu suor

Já não te vale nada,

É tanto o senhor

A comer da tua braçada.

 

É preciso alertar,

Anda por aí tanto canalha

Só a querer sugar

O suor de quem trabalha.

A querer sugar

O suor de quem trabalha,

Anda por aí tanto canalha.

 

Teu corpo cansado

Teima em continuar,

Tu até te sentes incentivado

Por quem só te quer explorar.

 

É preciso alertar,

Anda por aí tanto canalha

Só a querer sugar

O suor de quem trabalha.

A querer sugar

O suor de quem trabalha,

Anda por aí tanto canalha.

 

A semente está lançada,

Tu não a irás colher,

A força da tua braçada

Outros bolsos, irá encher.

 

É preciso alertar,

Anda por aí tanto canalha

Só a querer sugar

O suor de quem trabalha.

A querer sugar

O suor de quem trabalha,

Anda por aí tanto canalha.

 

A querer sugar

O suor de quem trabalha,

Anda por aí tanto canalha.

 

Francis Raposo Ferreira

06/12/2019

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Pingos de Chuva

Pingos de Chuva

 

Se cada pingo de chuva que cai

Levasse um desgosto meu,

Que sou órfão de mãe e de pai,

Quão mais feliz viveria eu,

Mas não os levam, e, assim

Só me resta carregar minha dor,

Que Deus tenha piedade de mim

E me dê a graça de teu amor.

Sendo pobre de bens materiais,

Bem rico de amor sei que sou,

A outras, não me darei jamais,

Do jeito que só a ti me dou,

Se aceitares minha oferta,

Dar-te-ei tudo quanto é meu,

Cantar-te-ei como se fora poeta,

Serás Julieta e eu, o teu Romeu.

 

Francis Raposo Ferreira

06/12/2019

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Novos Contos de Natal da Matilde 2019 – 6

 

O Livro do Dinheiro

 

O avô Martinho, como que adivinhando os pensamentos da neta, passou o dia a preparar a história que iria contar a Matilde nessa noite, pelo que assim que a pequenita, logo após o jantar, lhe disse naquele seu jeito meio traquinas, meio ternurento:

- Avô, afinal como era aquele livro do dinheiro que foste dar de presente ao Tio Patinhas? E já agora, quem lhe enviou tal presente?

- Quem lho enviou, não sei, pois não tenho o hábito de andar a mexer nas coisas dos outros e como o presente não era para mim, não tinha nada que ir bisbilhotar.

- Ah, nesse caso, vais-me dizer que também não sabes como era o livro, não é verdade? Bela, o avô é muito espertinho.

- Aí é que estás enganada.

- Sério! Porquê?

- Porque, ao que sei, pelo que me disse o Pai Natal, só há dois exemplares daquele livro, o tal que entreguei ao Tio Patinhas e outro que está comigo desde que o Pai Natal mo ofereceu.

- Sério! Tu tens um livro do dinheiro, mesmo de verdade?

Os olhos da pequenita quase lhe saltam das órbitas. Geralmente leva as histórias do avô, meio a sério, meio a brincar, mas agora, se o avô lhe diz que tem um exemplar do livro do dinheiro, é porque o tem mesmo, pois ele sabe que ela não descansará enquanto não o vir:

- Claro que tenho. Olha ali para a última prateleira da estante da esquerda, lá mesmo no cantinho.

Matilde levanta-se, vai até à estante indicada pelo avô, estica-se toda e lá consegue ler “Livro do Dinheiro”.

- Avô, podemos vê-lo?  Quero dizer, posso vê-lo, pois tu já deves estar farto de o ver.

O Avô levanta-se do seu cadeirão, vai até à estante, retira o livro e volta a sentar-se. Matilde não perde tempo, vindo logo sentar-se no seu colo:

- Como funciona o livro, avô?

O avô Martinho não se lembra de vez alguma ter visto a neta tão crente em alguma das histórias que lhe tem contado, como agora:

- Este livro é um livro mágico.

- Mágico!

- Sim. Todos os dias, aparece uma nota, verdadeira, numa das folhas do livro, umas vezes de um valor, outras de outro qualquer, quase nunca se repetindo em dias seguintes.

- Isso é mesmo mágico. Assim podes ficar muito rico.

- Pois é, só que há uma condição para se poder ficar com o dinheiro do dia.

- Qual é?

- A primeira pessoa a abrir o livro em cada dia, tem o direito a ficar com o dinheiro, mas só se cumprir a única regra que lhe é imposta.

- Qual é, avô?

- Essa pessoa, a primeira a abrir o livro, só tem direito ao dinheiro se abrir o livro na página certa, isto é, naquela onde está a nota.

- E se a pessoa abrir noutra página qualquer?

- Nunca ficará a saber qual era a página onde estava a nota, nem qual o seu valor, pois, por isso é que o livro é mágico, a nota desaparecerá automaticamente ao abrir-se o livro na página errada.

- Avô, não podemos fazer batota?

- Matilde, além de ser uma coisa muito feia, os duendes, ou seja, lá o que for, não se deixam enganar, só quando querem e se for por um bom motivo.

Matilde, mostrando-se ensonada, manifesta vontade de se ir deitar mais cedo que o habitual, algo que não escapa ao olhar atento do avô:

- Está bem, minha netinha, se está assim com tanto soninho, vá lá dar um beijinho à Bela e pode ir para a caminha, quem sabe se assim, amanhã é a primeira a levantar-se e poder ser a primeira a vir abrir o livro mágico do dinheiro.

- Não é nada disso, avô. Acredita, estou mesmo cheia de sono.

Matilde quase nem dorme nessa noite, temendo deixar que o avô se levante primeiro e vá abrir o livro.

 

Francis D’Homem Martinho

06/12/2019

 

 

 

 

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Novos Contos de Natal da Matilde – 5

Inocência de Criança

Matilde acordou cheia de vontade de fazer uma pergunta ao avô, mas teve de esperar até depois do jantar:
- Avô, aquele teu amigo, o Zé do Telhado, roubava aos ricos para dar aos pobres, verdade?
- Sim. Porquê?
- Ele nunca foi preso?
- Se foi, tantas e tantas vezes. Até foi na prisão que ele conheceu os irmãos Metralha.
- Ele era amigo dos irmãos Metralha? Eles existiram mesmo? Eu pensava que eram simples desenhos animados.
- Ficas a saber que quase todos os personagens dos desenhos animados, são inspirados em pessoas reais. Olha o Tim-Tim por exemplo.
- Avô, que tem o Tim-Tim?
- Então não sabes em que é que o Tim-Tim foi inspirado?
- Não. Tu sabes?
- Claro que sei, foi em mim. Um dia, quando fores lá à Barroca, pergunta aos pais dos teus amigos e vais ver como falo verdade.
- Sério! Não me digas que até tinhas um cão chamado Milú.
- Claro que tinha.
- Que engraçado, já afora, quem é que inspirou o capitão?
- Ah, isso, já não sei.
- Bem, está bem. Mas voltando ao Zé do Telhado, se ele era preso por roubar os poderosos, como conseguias sair da prisão?
- As prisões de antigamente não eram como as de hoje, eram feitas em madeira, o que acontece é que o Zé do Telhado tinha dois grandes amigos, o Pica-Pau e o Speedy Gonzalez, o rato mais veloz do mundo. Assim que sabiam que o Zé do Telhado tinha sido preso, o Pica-Pau começava logo a fazer buracos no telhado e nas paredes da prisão, depois vinha o Speedy Gonzalez e, num instante, roía a madeira de maneira a unir os buracos feitos pelo Pica-Pau e possibilitar que o amigo pudesse fugir, para o que contava com a ajuda dos irmãos Metralha que iam contando histórias ao guarda.
- Oh avô, tu também podias ser um dos irmãos Metralha, pois jeito para inventares histórias, é o que tu tens mais.
- Olha, minha menina, fica sabendo que já contei histórias a gente muito importante.
- Eu sei avô, a avó Bela diz que tu lhe contavas com cada história que ela até ficava na dúvida se seriam verdade ou pura invenção tua.
- Pois, tu e a avó Bela fazem uma boa dupla. Podes não acreditar, mas num ano, pelo Natal, juntei mais de cem pessoas a ouvir a história da minha ceia de Natal com o Pai Natal e o Rodolfo.
- Oh avô, tu tiveste uma ceia com o Pai Natal? E com o Rodolfo? Mas o Rodolfo é uma rena.
- O que é que interessa se é uma rena ou outra coisa qualquer, também tem direito à ceia, ou não? Não foi só uma, foram muitas ceias que fizemos juntos. Tantas noites que eu o andei a ajudar a distribuir as prendas, depois comprou um carro eléctrico e pronto, nunca mais precisou da minha ajuda.
- Se andaste a ajudar o Pai Natal a distribuir as prendas, qual foi a que mais gostaste de distribuir?
- Olha, foi o “Livro do Dinheiro”, ao tio Patinhas.
- O “Livro do Dinheiro” ! Nunca ouvi falar de tal livro.
- Não! Amanhã te contarei a sua história. Agora vamos dormir que se faz tarde.
Nessa noite, Matilde sonhou, de facto com um livro do dinheiro, foi um sonho bastante estranho, pois o livro, no lugar de palavras, tinha notas, as histórias do avô tinham o condão de a fazer sonhar com tudo quanto fosse possível caber na inocência das crianças.

Francis D’Homem Martinho
05/12/2019

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Em Cama Alheia

Em Cama Alheia

Quem não teme deitar-se em cama alheia,
Arrisca buscar a própria desgraça,
Quer seja rico em cama de plebeia,
Quer seja pobre em cama de ricaça.

Ninguém gosta de se ver enganado,
Podendo ir da loucura à desgraça,
Jovem deitada com o namorado
Ou bonito moço em vez do carcaça.

Há, por aí, tanta cama trocada,
Eu é que nem trago na minha ideia,
Estrear cama, que já foi estreada.

Boa cama, quem a quiser que a faça,
Sabendo que deitar-se em cama alheia,
É semear sua própria desgraça.

Francis Raposo Ferreira
05/12/2019

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O Guitarrista e a Fadista Matilde

Novos contos de Natal da Matilde – 2019

 

04 – O guitarrista e a Fadista

 

Matilde passou o dia numa grande luta para conseguir resistir à tentação de perguntar a Bela, a avó nova, quem era o tal do Zé do Telhado de que o avô lhe falara na véspera, pois se de Robin dos Bosques já ouvira falar, deste seu primo, segundo o avô, é que não se lembra nada de alguma vez ter ouvido seja o que for.

Só o facto de gostar tanto da histórias do avô Martinho é que a impede de procurar satisfazer toda a sua curiosidade, mesmo sabendo que o avô é bem capaz de inventar uma história completamente diferente da realidade, mas isso é algo que pouco lhe importa, pois as histórias servem para isso mesmo, para embelezar a vida de cada um de nós.

Uma das coisas que o avô lhe disse e que ela já desconfia que seja invenção dele, é o facto desse tal Zé do Telhado ser primo do Robin dos Bosques:

- Olá avô, então, vens muito cansado?

- Por acaso até venho, só me apetece é sentar e descansar.

- Boa. Anda daí que o teu cadeirão te espera. Eu vou ajudar a Bela a arranjar o jantar.

O avô sabe, muito bem, o que a pequenita quer, ou não a conhecesse como conhece. Quer é dar-lhe tempo para ele poder montar a história do Zé do Telhado e do Robin dos Bosques. Que grande sarilho, ele, foi arranjar.

- Bem avô, agora que já descansaste e já ajudei a Bela a arrumar a cozinha, está na hora da nossa história, até porque está tanto frio que só me apetece é sentar-se bem ao pé da lareira. Conta-me lá, quem era esse Zé do Telhado? Ele era mesmo primo do Robin dos Bosques?

- Claro que era. Aliás, foi o próprio Robin dos Bosques, quando me viu lá na Ponderosa e soube que eu era português, que me perguntou se eu conhecia o primo dele.

- E tu conhecias?

- Claro que conhecia. Morávamos mesmo porta com porta, ali no Pátio das Cantigas.

- Avô, tu moraste no pátio das cantigas?

- Então não morei. Se tu visses o reboliço que aquilo era por causa do Zé do Telhado, ele passava a vida a roubar o vinho ao Evaristo, não era para beber, mas sim para dar aos pobres lá do bairro.

- Avô, quem era sesse Evaristo?

- Olha minha netinha, era um pobre homem, chamavam-lhe o pai tirano, mas ele, coitado, não fazia mal a ninguém. Vê tu que ele até sabia que o Zé do Telhado o roubava, mas fingia que não sabia. Claro que fazia aquilo tudo por causa do grande amor que tinha pela Menina da Rádio.

- Avô, esse tal de Evaristo, gostava da menina da rádio?

- Oh, se gostava. Aquilo era um amor digno de se ver, de se ver e de se ouvir.

- Ouvir!

- Sim. Foi por causa desse seu grande amor, que ele escreveu a canção de Lisboa.

- Como se chamava essa tal de menina da rádio?

- Ora como se chamava, era a Maria Lisboa.

- Bem, isto já está para aqui uma grande confusão. Explica-me, lá bem quem era o Zé do Telhado e como é que ele era primo do Robin dos Bosques.

 - Não há confusão nenhuma. O Zé do Telhado era um dos maiores guitarristas cá da terra, o que ele mais gostava era de andar pelo Bairro Alto a acompanhar as fadistas vadias que por lá apareciam sem quem as acompanhasse à guitarra e à viola.

- Oh avô, as fadistas eram vadias!

- Vadias é uma forma de dizer, chamavam-se assim por cantarem o fado dito vadio, aquele que andava na boca do povo.

- Está bem, mas o que é que isso tem a ver com o Robin dos Bosques?

- Então, certo dia, estava o Zé do Telhado a acompanhar uma fadista, quando apareceu uma Inglesa muito bonita, a mulher estava encantada com o guitarrista, dali até ao casamento não demorou muito. Era uma prima do Robin dos Bosques. Quem não gostou muito, foi o antigo namorado dela.

- Ela tinha um namorado? E trocou-o pelo Zé do Telhado?

- Sim. Ela namorava com o Tarzam, mas como ele passava os dias a treinar natação, ela resolveu treinar com o Português.

- Eles foram felizes?

- Não. O casamento durou pouco. O Zé do Telhado, no próprio dia do casamento, em conjunto com o Robin dos Bosques, roubou as joias todas dos convidados e distribuíram-nas pelos mais pobres.

- Avô! No próprio casamento deles?

- É verdade.

 Matilde, já não se entendendo com tamanha confusão, vê-se a sonhar com um bonito rapazinho que lhe parece ser o Marco, um seu vizinho, o qual toca guitarra enquanto ela canta um fado com letra de Natal. Se já estava confusa, ainda mais confusa fica, pois nem sequer sabia que sabia cantar o fado, ainda para mais com música de Natal.

Matilde não é a única a dormir junto à lareia, o avô Martinho acompanha-a no sono e nos sonhos.

 

Francis D’Homem Martinho

04/12/2019

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Fato Novo

Fato Novo

Escolhido o melhor dos alfaiates,
Tive de fazer mão de minhas artes,
Para que me fizesse um fato novo.
Precisava de convencer o povo.

Camisa com gravata a condizer,
Aprimorei-me, gostei de me ver.
Assentavam-me que nem um primor,
Ali estava um verdadeiro senhor.

Tudo dentro do tom, saí à rua.
Nunca, minha alma estivera tão nua,
Todos me desejam cumprimentar.

Nem hesitam tratar-me por doutor,
Agora sim, era mesmo o melhor.
Um fato novo, e deixam-se enganar.

Francis Raposo Ferreira
04/12/20193755265624?profile=RESIZE_710x

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Sorri

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Quando alguém ousar fazer-te sofrer,
Nunca lhe chores, encara-o, sorri,
Crê em ti, só assim podes vencer
Quem ansiava por vencer-te a ti.

Quando, algum dia, alguém te magoar,
Nunca lhe chores, encara-o, sorri,
Crê em ti, não te deixes humilhar,
Primeiro, terás de pensar em ti.

Quando, algum dia, alguém te ousar trair,
Nunca lhe chores, encara-o, sorri,
Ainda que saibas estar a fingir.

Quando, algum dia, alguém te maltratar,
Nunca lhe chores, encara-o, sorri,
Só quem sorri, sabe o que é amar.

Francis Raposo Ferreira
04/12/2019

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Novos Contos de Natal 2019 - A Descoberta

Novos Contos de Natal 2019 – 3

 

A Descoberta

 

 

Matilde, cansada como andava, não só pela excitação provocada pelas novas histórias do avô Martinho, como também pela curiosidade em saber no que consistia o grande segredo resultante da inesperada visita de Hoss, do Bonanza ao seu avô, mas ainda, principalmente isso, pelas duas noites anteriores, uma das quais sem conseguir dormir, decidiu aproveitar o frio que se fazia sentir hoje de manhã, para se deixar ficar deitada até mais tarde.

Quando, finalmente, se decidiu levantar e descer até ao piso inferior, constatou que o avô não estava em casa, pelo que só lhe restava esperar pela sua chegada:

- Avô, por onde tens andado?

- Ora minha netinha, nem toda a gente se pode dar ao luxo de ficar na cama até quase ao meio-dia. Mas fizeste muito bem, está um dia muito frio. Amanhã, de acordo com o homem do tempo, ainda vai estar mais frio, por isso, é melhor que te deixes ficar no quentinho da cama.

- Pois sim, mas não penses que é por ter ficado até mais tarde na cama, que te escapas de me contar o teu segredo de Natal. Ontem acabei por adormecer sem mo mostrares, mas hoje já não vai ser assim.

- Está bem, depois do jantar, prometo-te que te mostro esse meu segredo.

- Ah, depois do jantar, eu conheço-te muito bem, queres é ver se me adormeces sem mo mostrares, se é que tens mesmo algum segredo com esse teu amigo americano.

Assim que acabaram de jantar e após ajudar Bela, a sua avó nova, a arrumar a cozinha, a pequenita veio logo a correr para o colo do avô:

- Pronto, já me podes falar do teu segredo.

- Está bem, prometi e vou cumprir, mas primeiro deixa-me pôr um outro filme do Bonanza a passar.

O filme foi rodando e o avô não parecia disposto a cumprir o prometido:

- Avô, estamos no mês do Natal, é muito feio mentir às crianças.

- Eu não te menti, estou a cumprir com o prometido, a mostrar-te a prenda que o Hoss me trouxe da América.

- Oh avô, não estou a perceber nada do que me estás a dizer.

Foi então que a avó nova decidiu meter-se na conversa:

- Matilde, olha bem para o filme e para onde o avô está sentado.

- Ah, já percebi tudo. O teu amigo Hoss ofereceu-te o cadeirão onde o pai dele se costumava sentar, verdade?

- Sim senhor, estou a ver que tenho uma neta muito inteligente.

- Avô, foi mesmo o teu amigo que te ofereceu este cadeirão, ou foste tu que o fizeste? Sim, que sei, muito bem, como és habilidoso.

- Não, que é lá isso? Achas mesmo que eu era capaz de fazer uma obra de arte como esta?

- Acho. Mas deixa lá, mesmo que tenhas sido tu a fazê-lo, também faz parte da tua história. Porque é que ele te ofereceu o cadeirão que era do pai dele?

- Porque o amigo do meu pai, aquele que vivia lá na América e que lhe falou de mim, lhe disse que eu gostava muito de imitar o pai dele a sentar-se neste cadeirão.

- Ah, estou a perceber tudo. Só o conheceste a ele?

- Não. Quando fui lá à América, conheci a família toda.

- Avó Bela, o avô já foi à América?

- Não sei, ele já correu meio mundo.

- Claro que fui, ainda tenho o bilhete, religiosamente guardado. Olha, até te vou contar mais, quando fui ao rancho dele, a Ponderosa, o irmão dele, o Joe, aquele do cavalo malhado de preto e branco, convidou-me para participar num concurso de tiro, ora como eu era o melhor a atirar com a fisga, ganhei o concurso.

- Sério, avô?

- Sério. O Joe ficou tão impressionado com a minha pontaria que até fez questão de me apresentar a um grande amigo dele, o Robin dos Bosques. Já ouviste falar dele?

- Não, quem é?

- É um primo afastado do Zé do Telhado.

- Zé do telhado! Nunca ouvi falar de ninguém com esse nome.

- Está bem, amanhã te contarei a história deles.

Matilde, embalada nas histórias do avô Martinho, deixava-se vencer pelo sono e já sonhava com o avô Martinho a atirar fisgadas contra os pratos para espanto dos familiares e amigos de Hoss, enquanto o dono do rancho Ponderosa ia construindo o cadeirão onde agora, ela, dorme ao colo do avô.

 

Francis D’Homem Martinho

03/12/2019

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Falar de Amor

Falar de amor

 

Falar de amor

Não é nada complicado,

Agora o pior

É falar de amor

Mas de amor dedicado.

Um velhinho

Que fica todo o dia

Esquecido, sozinho,

Trocava com alegria

Tudo por um carinho.

Um doente acamado

Na solidão e hospitalizado

Até pede para morrer

Quando se vê abandonado

Por a quem deu o viver.

Dar tudo a alguém

Pode não ser amor

Mas por egoismo também

Só para não ouvir ninguém

Chamar-lhe de estupor.

A felicidade de um velhinho

Não está num simples olá,

Mas sim no gesto

De amor e carinho

Que o seu filho lhe dá.

 

Francis Raposo Ferreira

03/12/2019

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