Posts de Rui do Vale Paiva (22)

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Conversando com o Espelho

 

 

 

Por um instante

vou à deriva:

é o momento mágico

que respiro relaxadamente.

 

Daí olho com desvelo

o contorno que delimita

a minha expressão de amor,

ou seja, o meu corpo.

 

Em transe, eu sou todo matéria.

Agradeço ao meu íntimo,

pela interação de seus órgãos unidos,

jungidos e investidos em qualidade.

 

Encontro-me aqui por alguma razão:

cumplicidade, dividir ou compartilhar.

 

Não vim por acaso, mas louvo

ao deus das letras pela oportunidade

cedida e energizada que disponho em elaborar

minha arte no meu silêncio interior.

 

Alimento-me de grãos de felicidade

e do ponto onde me encontro,

contemplo minha alto-estima

enquanto observo sua harmonia.

 

 

 

 RUI PAIVA 

 

 

Saiba mais…

Decifrando-me

 

Havia na era romana quem dissesse “cine ceros”

referindo-se a escultures honestos, ou sinceros,

pois esculpiam obras puro mármore sem trincas,

sem adicionar um tipo de cera."

 

de início

surge o silêncio

logo após o amor,

ambos produzem os poderes.

tudo advém d’aquilo que penso.

 

poderes procriam os valores

que se tornam moedas de troca,

servem de escambo para meu ritmo de vida

- física e verbalizada.

 

o meu pensar

na tentativa de tocar o silêncio

por frações de segundo

se esquiva de toda a sua criação.

 

 

Rui Paiva

Saiba mais…

Amor Rabiscado

 

 

 

Quis o tempo escorrer qual areia

por entre os dedos dispersos

esvaiu-se de modo que se creia

os valores na vida sejam inversos

 

Seja ao sol ou faça-se chuva invernal

ou se alongue a gélida madrugada

jamais permitirei meu sonho hibernal

colidir com alguma dor enclausurada

 

Sendo assim, posto se solidifique

a chama da saudade não esvaneça

e a luz dos dias mais viva edifique

antes que o meu delírio aconteça

 

Quero sazonar em teus doces encantos

qual o beija-flor sugando castas flores

não me fiarei em ledos desencantos

nem me encontrarei em frios desamores

Saiba mais…

Amigo de verdade

 

 

Pode ser um dia não nos falemos mais...

Decerto, enquanto houver amizade

brigarmos sequer, jamais...

Pode ser que um dia, bem tarde,

quando os gestos falarem por nós

os olhos embaçados e sem alarde

o coração será a nossa voz

Pode ser que um dia mudemos os horizontes

ainda perpétua será a nossa amizade


as recordações lembrarão as nossas fontes

e o tempo não mudará a nossa lealdade


Pode ser que um dia por certo balbuciaremos
o nosso nome servirá de intercalo

e, acaso nascêssemos novamente,
seríamos amigos e a isto brindaremos

- ao nosso impenetrável intervalo.

 

Acaso aguentaríamos suportar a nossa solidão?

Chega-me a sensação de abismo infindável

ouso, no entanto, apertar a sua mão

para celebrar nosso aconchego inabalável.

 

Saiba mais…

Admirável

 

 

Tens a volúpia
de uma serpente egípcia...
Os olhos subjugados
ao ardor da paixão
A beleza morena de uma
montanha felícia
O silvo do amor
de uma cratera em erosão.

Píton que me hipnotiza
e me alucina
Mexes com a sanha
da minha libido
(Doce mulher vicejando
ares de menina)
Encantas e me seduzes
ao desejo proibido.

Quisera descortinar
teu mavioso universo
Gueixa que em meu peito
faz contorcionismo inenarrável
Teu fogo procrastina
minha morte ao reverso
Vida! Tornas o viver em excelência
e o vasto mundo admirável.

 

 

Rui Paiva

Saiba mais…

Biografia

 

Sou plural
se me deparo
com coisas
singulares.

Sou oblíquo
longitudinal
rarefeito,
ao avesso
da alma.

Me apaziguo
no complexo
contexto
das situações
amenas.

Sem alvoroço
ou delongas:
sou poeta,
apenas.

 

Rui Paiva

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Sangria

 

 

Ao gerar lemas, temas,
poemas,
minha alma canta
e se encanta
com a ternura dispersa
em meu ser,
é um sempre
renascer!

Atmosfera de aleias,
mirra e incenso
mesclam-se às ideias
nascedouras
do que penso.

Sinto a letra
sutil
que me adorna
e me contorna
a tornar-me
útil.

O verso me unifica
ensolara meu universo
apascenta e pacifica
o sonho controverso.

Sou poesia...
- entoar de pássaros
canoros ao raiar do dia;
flautins ritmados
a embalar meus sonhos,
embornal de sabores
liquefeitos
a deliciar meus amores
e tanger momentos
inoportunos e enfadonhos.

Eu me completo
- e isto me contagia!-,
com o verbo seleto
que do peito
faz sangria.

 

 

Rui Paiva

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Torpor

 

O Silêncio não apavora tanto
quanto à incerteza de tua vinda
linda é a música, doce o acalanto
pranto não desata, espera ainda

Há a esperança, esta a última chama
clama o meu peito ainda por tua presença
intensa a angústia, ai, a de quem ama
derrama o choro, pois, no porão da crença

 

 

Rui Paiva

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Odisseia

 

 

Vinte vezes sorri
Na bruma dos meus sonhos
E tu, alheia a tudo,
Apenas um olhar de desleixo
A mão sob o queixo
No chão atapetado de veludo

Na bruma dos meus sonhos
Vinte vezes eu sorri
E na brisa da campina
Tu corrias livremente embalada
- lá se ia a minha menina –
uma estrela na rósea alvorada

Sorri mil vezes mais
No sonho mais e mais nebuloso
...flores perfumosas em forma de leque
o sorriso era teu, as músicas as tuas
- e eu, esse teu moleque –
amando-te sempre ao passar das luas.

 

Rui Paiva

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Prelúdio

 

A chuva é bem-vinda,
pois há tanto não a tinha tão próxima!
Chegou cadenciada e trouxe cheiro de chão molhado
e viço de planta airosa.
Com ela, fragores de uma noite incipiente
resoluta em roubar-me o sono.
Entrego-me, porém.
Divago entre respingos e murmúrios diversos.
O céu é uma abóbada luzidia,
uma arena onde meus sonhos pululam
e minhas reminiscências despem-se de vestes rotas
e cheias de pó.
Uma música indefinida entrecorta mas, assim,
serve-me de prelúdio.

Rui Paiva

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Reencontro

 

 

A face turva e enevoada da lua
ilumina – tímida - a abóbada sideral
papeis rodopiam ao longo da rua
ferindo o silêncio quase sepulcral

Retine a sineta à porta da frente
intermitente como o ladrar de um cão
abro e te dou passagem, solenemente
entras a beijar-me com sofreguidão

Percebo más noites pela insônia herdadas
na morrediça luz refletida tenuemente
dos teus olhos de cores amendoadas
na tua pele macia a tremer virginalmente

 

 

Rui Paiva

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Ritual

 

 

Imagina a gota de orvalho
percorrendo teu corpo
escorrendo pelo teu
queixo
torneando teu pescoço
alojando-se em teus seios...
Um estalido, apenas,
denunciaria que era
minha língua
impetuosa
iniciando o ritual
de beijar teu corpo
desnudo...
tua alma abrindo-se
como um leque
de desejos...
Lá fora,
uma lua imóvel
e sôfrega,
prateava a silhueta
estonteante
do nosso abraço
infinito
até o êxtase...

   Rui Paiva

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História de Amantes

 

 

Há uma paz indomável
dormitando em sua alma
efervescente, porém, de amor...
Um instinto incontrolável
remove seu corpo, e espalma,
um gesto de delírio e fervor

Minha língua o seio percorre
pontiagudo e morno de paixão
Invioláveis segredos armazenados
à luz de uma vela, ora vive, ora morre!
Lá fora chove, de repente um clarão
realça o contorno - estamos abraçados -

Em nosso peito, bate um só coração
achamo-nos incrivelmente imantados
Aflora o fogo ardente, tudo é chama
beijo o ventre vibrante , tenro e macio
seus beijos são ávidos, sua boca clama
por minha pele, enquanto a acaricio


Palavras saem soltas, livres, sem nexo
poemas de amor antes jamais editados
e nossas mentes flutuam soltinhas no espaço...
Em evoluções contínuas, possuo o seu sexo
respiração ofegante, nossos corpos suados
um irreprimível gozo explode num amplo abraço...

 

 

Rui Paiva

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Retalhos de poemas

 

Velho, bastante velho, o casarão.

Batentes de acesso cheios de limo

Há poeira nas vidraças; e o porão

escoa a luz do sol como empréstimo.

 

Ando desconfiado que algo aconteceu

e que cinco vezes passaste por mim

eis que de repente aconteceu

e fiquei lânguido e pasmo assim.

 

Cinco vezes passaste diante de mim

eu poderia grunhir a todos: Eureka!

Não vi teus lábios cor carmesim

Fui tocar para os cometas minha rabeca.

 

E doze flautins logo sucederam, afinados

enquanto eu amotinado e amordaçado

combalia no escuro porão e batentes limados

vi Júlio César galopar sobre um cavalo cacheado.

 

 

 

 Rui Paiva

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Roteiro de viagem

 

 

Nos confins da minha alma

há um verdadeiro fulgor

que desmente a minha calma

e deslancha o meu amor.

 

Paridade há quando somos unos

e fiéis somos a qualquer custo.

Da vida seremos sempre alunos

vigor é ganharmos tudo sem susto.

 

Decifrar o código que nos abastece

é de nossa inteira responsabilidade

nossa mente tão sã apenas aquiesce

o teor da nossa longeva vaidade.

 

Somos passageiros da nave milenar

aboletados em confortáveis poltronas

imaginamos longa vida a prosperar

com as nossas dúvidas brincalhonas.

 

 

Rui Paiva 

 

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Simplesmente Singular

 

 

 

 

Singular, o meu sentimento por ti

já que sonhas de forma inusitada

tens o olhar mais doce que já vi

olhos famintos no rubor da madrugada.

 

Tua boca é um adereço que me encanta

tatuá-la de beijos é uma colossal quimera

esteio da paz e um desejo que me espanta

ritual se faz presente e a minh’alma espera.

 

Teu cheiro na pele bronzeada me seduz

teu abraço me conforta; fonte me revigora

teu sorriso, estrada a me seguir cheia de luz,

o teu carinho ao espaçoso Éden me conduz.

 

É possível imaginar que um dia aconteça

e eu passe horas sem te sentir e te beijar?

dos males este é o maior que eu pereça  

e faria por si só meu devaneio agonizar.

 

 

 

 Rui Paiva

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Caule Verdejante

 

 

Teu colo é um vale de desejos

um manancial de imensos veios

onde irrigo com delirantes beijos

as túmidas colinas de teus seios.

 

Murmuras – tu arfas levemente...

e no entorno de tua derme/ventre

ouso massagear bem docemente

até que a chama de amor adentre.

 

A existência sem o teu sorriso que seria

(por mais densa, fria que se apresente)?

Sem enrosco do teu corpo, o que faria,

senão vivê-la parcial, tola e falsamente?

 

 

O grão da eternidade já foi disseminado.

Entre as mãos, imagino o caule verdejante

de nossa inteira e total responsabilidade

a brotar em nossa vida tão importante.

 

 

 

 Rui Paiva

 

 

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Caso por acaso

 

 

Um poema escrito na areia

revela a existência ou não das marés.

O sal conserva os fósseis nas rochas.

Não me lembro onde vi essa afirmação

mas a poesia a endereçou pra mim.

 

Minha caixa postal lotou-se de incertezas

então prossegui a caminhada sabedor

de que o cais dos meus pensamentos

situa-se à beira do mar...

 

O mar pertence ao poeta

que engoliu a noite

encostado no poste da solidão

fincado no solo arenoso,

próximo ao poema rabiscado na areia,

à beira-mar.

 

Caso a moça tenha lido a inscrição,

foi por acaso: o homem das rimas

amassara com criteriosa vontade

o coração dele.

 

Ah, a noite irrompera por acaso,

caso alguém pergunte.

 

 

Rui Paiva

Saiba mais…

 

 

A um sopro do vento,

levas de folhas secas valsam estilosas,

mal comparando – airosas -,

como se fossem borboletas volteando a espavento. 

 

Despem-se de suas árvores frondosas

- quais páginas de velho calendário pregado à parede,

sacudidas, deixam suas bases fibrosas

e jazem no meio fio dos canteiros em rede.

 

Mais uma rajada,

outro punhado de lâminas se desprega da galharia

e flutua em forma espiralada,

projetando piruetas aéreas, à revelia,

juntando-se aos montículos já deslocados no chão,

na palma da mão.

 

Dois olhinhos miram a trajetória das folhas,

 - que se despedem com realeza -

e contemplam como se fossem bolhas,

o maravilhoso baile da natureza.

 

O menino, na pequenez de sua idade,

pensa grande, igual à gente adulta:

tudo ao nosso redor se transmuta,

as mudanças acontecem com velocidade,

o tempo cuida desse processo de novidade.

 

Percebe a presença de pássaros errantes;

bicam sutilmente flores em forma de cálices coloridos,

uma nuvem de abelhas acirrantes

rente aos cachos dos frutos amadurecidos.

 

 

Do banquinho da praça,

o garoto dá conta de um grupo de meninos

que pratica brincadeira, arruaça,

casais inúmeros gesticulam e trocam mimos.

 

 

O pequeno espectador

retira da mochila sua flauta de taquara

e com ares de tocador

seus lábios produzem notas de beleza rara.

 

O vento continua desprendendo a folhagem...

o menino propaga com suavidade a cantiga dos anjos...

o sopro de ambos transforma tudo... e os arranjos

do tempo modificam toda a paisagem...

 

 

Rui Paiva

Saiba mais…

Trama de Amor

 

 

Teu corpo é uma constelação

onde hiberna o sol da manhã...

recende a sândalo: fecundação

mítica de uma nova Aldebarã.

 

Pouso meu beijo ávido em ti

reino absoluto em tua tenda

- saberás que um dia sobrevivi

no teu colo, perfumada vivenda.

 

Sagaz a nossa trama de amor:

semeada de sonhos e adágios,

sintonia de existências e fervor

arraigados de bons presságios.

 

Alunisso em teu sonho orbital

minha nave planeia teu anseio,

e deslizo por tua senda sideral

e sugo voraz teu arfante seio.

 

 

Rui Paiva

 

Saiba mais…
CPP